Tratamentos para transtornos de ansiedade

Dois grandes tipos de tratamento realizados com crianças são abordados a seguir. Estão referidos em estudos nacionais e internacionais: abordagens psicossociais e tratamentos farmacológicos.

A junção de ambas abordagens mostra resultado promissor (Cohen et al., 2004; Brown et al., 2004; Arroyo, 2001; Nader, 2004; Caminha, 2005). Não serão apresentados tratamentos específicos para cada tipo de transtorno de ansiedade, e sim as principais abordagens utilizadas para os transtornos ansiosos em geral.

De uma forma geral, os tipos de tratamento são similares, apenas mudando objetivos e empregando técnicas específicas para cada tipo de desordem psicológica. Para saber mais detalhes, a busca a textos especializados e a troca de experiências com profissionais de saúde mental se fazem necessárias.

Abordagens psicossociais

As abordagens psicossociais costumam ser utilizadas em todos os tipos de transtornos ansiosos. A linha mais recomendada é a terapia cognitivo-comportamental. A teoria por trás desta estratégia de atendimento entende que a aprendizagem social é o aspecto fundamental a ser levado em conta.

Os sinais cognitivos, afetivos, fisiológicos e ambientais que acompanham os transtornos de ansiedade, especialmente quando decorrentes de eventos traumáticos, passam a ser estímulos condicionados que desencadeiam respostas condicionadas sob a forma de sintomas. A seguir serão descritas resumidamente algumas características das principais abordagens psicossociais.

Técnicas cognitivo-comportamentais

A terapia cognitivo-comportamental (TCC) é uma abordagem psicoterápica, estruturada, direcionada a resolver problemas atuais, modificando pensamentos e comportamentos disfuncionais. Propõe que a avaliação realista, com modificação de crenças disfuncionais, produz melhoras emocionais e comportamentais. Alguns mecanismos utilizados são:

  • imaginação repetida revivendo o trauma promove a habituação e reduz a ansiedade associada com a memória traumática. Também corrige a ideia errônea que a ansiedade permanece para sempre, se a pessoa não conseguir escapar da situação;
  • confrontar deliberadamente memórias de medo bloqueia o reforço negativo que acontece quando a pessoa sente alívio ao fugir de pensamentos e sentimentos relacionados ao trauma;
  • reviver o trauma em um ambiente terapêutico e de apoio incorpora informações de segurança à memória do trauma; • focar na memória traumática sobre o evento por um período prolongado ajuda o paciente a diferenciar o evento traumático de outros, não traumáticos. Busca situar o trauma como um evento específico, minimizando a ideia de que o mundo é perigoso;
  • revivência imaginária ajuda a mudar o significado dos sintomas e a sensação de incompetência pessoal para um signo de poder e coragem;
  • revivência prolongada e repetida do trauma permite a oportunidade de focar os detalhes centrais de avaliações negativas e modifica-las.

Dentre as técnicas mais utilizadas na TCC em faixas etárias mais velhas têm-se: (Rothbaum et al., 2004)

  • Terapia de exposição: a exposição continuada a um estímulo ameaçador diminui a ansiedade, levando a uma redução da fuga e do comportamento evitativo que se mantêm via reforço negativo. Pode ser imaginária, in vivo (quando possível), gradual, direta. Alguns sobreviventes de trauma são relutantes a confrontar lembranças do trauma e tolerar alta ansiedade. Assim, nem todos são candidatos a terapia de exposição. Há evidências que não é indicada para pacientes em que a emoção primária é a raiva ou a culpa.
  • Dessensibilização sistemática: forma de terapia de exposição pareada com relaxamento. A resposta de relaxamento é incompatível com a resposta de ansiedade eliciada pela exposição; então, exposições curtas são interrompidas com relaxamento quando a ansiedade aumenta.
  • Treino de inoculação do estresse: inclui educação, treino de relaxamento muscular, treino respiratório, auto-diálogo guiado e parada de pensamento. Os pacientes aprendem a manejar sua ansiedade usando novas habilidades, reduzindo a evitação e a ansiedade.
  • Terapia do processamento cognitivo: o componente cognitivo inclui treinar pacientes em desafiar cognições problemáticas, particularmente culpar a si próprio. Já o componente comportamental, a exposição, consiste em escrever sobre o trauma e ler para o terapeuta e em casa.
  • Terapia cognitiva: a interpretação do evento, mais que o evento em si mesmo, determina o estado de humor. Assim interpretações negativas levam a estados de humor negativos. As interpretações errôneas tomam a forma de pensamentos automáticos. A terapia cognitiva foca na mudança dos pensamentos automáticos.
  • Treino assertivo: tem sido sugerido que a resposta assertiva, tão bem como o relaxamento, pode inibir o medo.

Tratamentos para transtornos de ansiedade

Em crianças, mesclam-se técnicas cognitivas e comportamentais, incluindo exposição, relaxamento/manejo de ansiedade e correção de atribuições imprecisas em relação ao trauma:

  • Exposição controlada a pistas traumáticas: alguns autores recomendam exposição gradual sistemática, pois muitas crianças hesitam falar sobre o trauma e isto pode torná-las mais sintomáticas durante intervenções de exposição.
  • Estratégias de manejo da ansiedade: recomendado que o relaxamento muscular progressivo, a parada de pensamento, as imagens positivas e o controle da respiração sejam ensinados previamente às crianças, antes das discussões detalhadas sobre o trauma.
  • Técnicas de terapia cognitiva: além da reestruturação cognitiva em relação à avaliação exagerada do risco e super responsabilização frente ao trauma, foca-se na avaliação e reconsideração de suposições negativas que crianças podem fazer em relação ao evento traumático, tais como: “foi minha culpa” e “nada nunca mais será seguro”.

Ludoterapia

Tradicionalmente se refere ao uso de brinquedos como uma técnica projetiva. Contudo, a maioria das descrições do tratamento focado no trauma advoga o uso da brincadeira e outras técnicas não verbais (desenhos e bonecas, por exemplo), como meio de aumentar o conforto da criança e a habilidade de comunicar na terapia, facilitando que ela acompanhe metas específicas. O uso de brinquedos é incorporado em várias intervenções terapêuticas psicossociais.

Psicoeducação

Muitas abordagens de tratamento incluem algum grau de psicoeducação para pais, crianças, e às vezes, professores. Abordagens individuais e em grupo são utilizadas. Em particular, educação sobre a experiência traumática é considerada benéfica para crianças e pais. São abordados temas como reações emocionais comuns em relação ao evento, como responder a ele e como se proteger se o evento voltar a ocorrer.

Incluir pais no tratamento ajuda a monitorar a sintomatologia da criança e a aprender técnicas de manejo comportamentais apropriadas, tanto nos intervalos das sessões quanto no término do tratamento. Estratégias de relaxamento frente à ansiedade têm se mostrado benéficas. Para atender de forma mais adequada à família e a criança com sintomas de ansiedade pode-se lançar mão da terapia de família. Esta terapia vai além dos limites da psicoeducação.

Amplia o foco dos sintomas ansiosos da criança e de seus pais ao valorizar toda a família como um sistema social flexível em que se pode propiciar a recriação e a mudança das versões e visões sobre as adversidades e sintomas vivenciados. Os pais, ou os adultos que estejam nesse papel social são a fonte primordial de socialização primária para seus filhos.

A criança, mais do que o adolescente, tem na família sua fonte de mediação com o que acontece fora de casa, já que são os familiares que decodificam para ela o funcionamento do mundo externo, então interiorizado como sendo o único mundo existente. É na convivência familiar que a criança aprende como deve se comportar e agir frente às situações que vivencia.

A maneira como os pais reagem emocionalmente aos problemas e o tipo de suporte que dão à criança são fatores que influenciam nos sintomas ansiosos infantis. A terapia de família irá abordar os temas que provocam tais sintomas na criança ampliando-os para o contexto familiar relacional fértil para o seu aparecimento.

Trabalhando com a complexidade das relações interpessoais que dão sustentação ao sintoma, a terapia de família visa a novos modos de coerência familiar que possibilitem formas transformadoras de convivência.

No mínimo, incluir pais no tratamento ajuda a monitorar a sintomatologia da criança e a aprender técnicas de manejo comportamentais apropriadas, tanto nos intervalos das sessões quanto no término do tratamento. Estratégias de relaxamento frente à ansiedade têm se mostrado benéficas.

Além disso, ajudar os pais a resolverem o próprio estresse emocional relacionado aos sintomas da criança e ao trauma (ao qual tiveram exposição direta ou indireta), pode levá-los a serem mais perceptivos e compreensíveis às necessidades emocionais da criança.

As intervenções com pais são consideradas imperativas na literatura sobre abuso infantil, onde é indicado um ou mais responsáveis participando do tratamento. E a maioria dos especialistas assegura que a inclusão dos pais ou de outras pessoas significativas no tratamento é resolução importante.

Abordagens psicanalíticas/psicodinâmicas

A abordagem psicanalítica nos transtornos ansiosos está indicada pelo fato de que a experiência originada pelo trauma psíquico rompe os mecanismos de defesa do ego e mobiliza uma série de defesas psicológicas como repetição compulsiva, negação, dissociação, projeção e identificação com o agressor.

É pouco utilizada em crianças com TEPT. Há pouca evidência que a psicoterapia psicodinâmica é efetiva em crianças com TEPT ou com outras sequelas do trauma grave. 77 Porém, uma variedade de autores defende intervenções psicanalíticas para crianças traumatizadas como intervenção primária.

Estudos de caso reportam o impacto do trauma e a resposta ao tratamento com referência a relações objetais, o uso de mecanismos de defesa e resistência. A terapia individual é usada como veículo para processar o impacto e significado do evento traumático.

Dessensibilização/reprocessamento dos movimentos oculares (EMDR)

Muitos consideram uma variante da terapia cognitivo-comportamental. É uma intervenção que combina componentes da exposição e da terapia cognitiva com movimentos dirigidos dos olhos. Pacientes são instruídos a evocarem aspectos do evento traumático enquanto seguem os movimentos para frente e para trás das mãos do terapeuta.

Estudos com adultos têm demonstrado alguma evidência do tratamento para o TEPT, embora o valor dos movimentos dos olhos especificamente não tenha sido avaliado. Alguns estudos relatam benefícios do tratamento para juventude traumatizada (Cohen et al., 2004).

Debriefing Psicológico (DP)

É uma intervenção providenciada rapidamente após o evento traumático. Visa prevenir sequelas psicológicas posteriores através da ‘normalização’ das reações e da preparação para enfrentar experiências traumáticas futuras. São empregadas várias estratégias terapêuticas como narrativa do evento, psicoterapia de grupo, aconselhamento de luto, catarse, terapia cognitivo comportamental e psicoeducação, entre outras (Bisson et al., 2000).

Alguns estudos internacionais descrevem abordagens de primeiros socorros psicológicos para crianças expostas à violência comunitária, a qual pode ser oferecida nas escolas como tratamento tradicional curto seguido ao evento traumático. Porém o debriefing psicológico é alvo de muitas críticas quando dirigido a crianças.

Esta técnica é questionada pelos próprios terapeutas e autores dos estudos, que lembram a necessidade de evitar discutir diretamente certos eventos traumáticos e problemas com as crianças por temor de influenciar a memória da criança em relação aos detalhes do evento ou seu testemunho em procedimentos legais.

De acordo com o estado atual de conhecimento, nem DP em grupo (de um só encontro) nem DP individual mais prolongado mostra-se capaz de prevenir o desenvolvimento sintomas ansiosos ou TEPT, após um evento traumático.

Alguns estudos de DP individual com adultos levantaram a possibilidade que re-exposição envolvida no DP pode re-traumatizar alguns indivíduos, sem permitir tempo adequado para habituação. Por isso é importante que o DP em adultos seja providenciado por pessoas com experiência, bem treinados.

Não devem ser obrigatórios, e os participantes devem ser devidamente assessorados clinicamente (Bisson et al., 2000).

Tratamentos farmacológicos

São utilizados com menor frequência que as abordagens psicossociais. Embora sejam vários os avanços obtidos na área na neurobiologia relacionada aos transtornos ansiosos, poucos ainda são os estudos realizados com crianças e adolescentes.

Os tratamentos para os transtornos ansiosos em crianças são indicados por psiquiatras infantis, que sabem qual medicamento e dosagem é mais adequado para cada tipo de transtorno de ansiedade. Nos últimos anos vem crescendo o uso de medicação para atenuar problemas de comportamento em crianças, acompanhando o maior investimento da indústria farmacêutica.

Hoje vivemos quadros antagônicos: corremos o risco da supermedicação para controlar comportamentos – banalizando a importância de se lançar mão deste recurso terapêutico para crianças que não têm transtornos sérios, ao mesmo tempo que vivenciamos a falta de medicação para crianças que efetivamente padecem de transtornos mentais mais graves, pela ausência de serviços e profissionais especializados.

Ainda não são muito sólidos os estudos clínicos sobre boa parte dos medicamentos usados em crianças. Funções do organismo infantil reagem diferentemente aos medicamentos, especialmente o metabolismo e a excreção. Por outro lado, o cérebro em desenvolvimento pode responder diferentemente às drogas psicotrópicas.

Por essas razões, não é correto realizar extrapolações das dosagens utilizadas em adultos (Mercadante; Scahill, 2005). A presença do psiquiatra é fundamental nessas situações. Para informação geral, algumas classes de medicamentos usados nos transtornos ansiosos de crianças estão listados a seguir (Eth, 2001; Silva, 2004; Mercadante; Scahill, 2005).

  • Inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS) ou antidepressivos SSRI: inibem o retorno da serotonina liberada na fenda sináptica para o interior do neurônio que havia liberado a serotonina.
  • Antidepressivos tricíclicos: atuam essencialmente pelo bloqueio de recaptação de neurotransmissores como norepinefrina e serotonina. Têm como efeitos colaterais fadiga, tontura, boca seca, sudorese, ganho de peso, retenção urinária, tremor, agitação. Alguns estudos sugerem a capacidade de alterar a condução elétrica do coração, razão pela qual, um acompanhamento cardiológico é fundamental durante o tratamento.
  • Beta bloqueadores e alfa agonistas adrenérgicos: os primeiros mostraram reduzir sintomas de hipervigilância em crianças com TEPT (Famularo apud Eth, 2001); os alfa-agonistas já foram utilizados em transtornos da atenção/hiperatividade em crianças abusadas sexualmente, com redução de impulsividade, agressão e sobressaltos exagerados. Riscos ao sistema cardiovascular indicam controle estrito quando do uso dessa substância.
  • Anticonvulsivantes vêm sendo sugeridos para o tratamento de TEPT, baseado na hipótese que a repetida exposição ao trauma pode eventualmente levar a sensibilização do circuito límbico e facilitação de crises.
  • Agentes serotonérgicos, antagonistas opióides, benzodiazepínicos e bloqueadores da dopamina e carbonato de lítium também têm sido utilizados para a redução de sintomas específicos.

Para o tratamento farmacológico ser considerado efetivo ele precisa: reduzir os sintomas de ansiedade, tratar outras comorbidades de saúde mental associadas e facilitar intervenções psicossociais. O diálogo e a negociação do tratamento com os pais da criança é um passo fundamental para garantir a adesão da criança ao tratamento e o seu sucesso (Mercadante; Scahill, 2005).

REFERÊNCIAS:

Assis, Simone Gonçalves de Ansiedade em crianças: um olhar sobre transtornos de ansiedade e violências na infância / Simone Gonçalves de Assis; Liana Furtado Ximenes; Joviana Quintes Avanci; Renata Pires Pesce. — Rio de Janeiro: FIOCRUZ/ENSP/CLAVES/CNPq, 2007. 88p. (Série Violência e Saúde Mental Infanto-Juvenil)


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