Skinner: Regras e contingências

De acordo com Skinner (1969b), devemos levar em conta quatro fatores quando tratamos das diferenças entre comportamento modelado pelas contingências e comportamento governado por regras. O primeiro deles, evidentemente, é que existem contingências de reforço. O segundo é que há repertórios comportamentais modelados e mantidos por essas contingências. O terceiro é que, a partir da observação, é possível fornecer uma descrição verbal dessas contingências em que são especificadas as ocasiões, as respostas e as consequências que as constituem.

O quarto fator, por sua vez, é que essas descrições podem configurar a ocasião para outras res‑ postas, isto é, podem fazer parte de outras classes operantes além das que originaram a descrição. Pode‑se dizer que as relações que constituem os comportamentos governados por regras são diferentes das que constituem os comportamentos modelados pelas contingências. A melhor forma de entender as diferenças é por meio de exemplos. Um sujeito pode conhecer todas as leis do trânsito, saber todos os detalhes técnicos do funcionamento do carro, conhecer todas as leis da física mecânica, mas isso não faz dele um bom motorista.

As regras não substituem as contingências. O treino é essencial para que um motorista se comporte efetivamente ao volante. Um músico entusiasta aprende a ler partitura e, assim, passa a ler diversas obras, desde as mais simples até as mais complexas, mas isso não significa que ele será capaz de executá‑las em um instrumento. O comportamento modelado pelas contingências implica que a pessoa esteja em contato direto com elas, fato que possibilita que o seu comportamento seja modelado minuciosamente pelas consequências – suas respostas podem se modificar aos poucos, até o ponto em que a pessoa esteja apta a responder efetivamente perante ocasiões das mais complexas.

Já o comportamento governado por regras não implica esse contato direto com as contingências. As descrições das contingências, ou seja, as regras, podem ser úteis quando a pessoa entra em contato direto com as contingências. Entretanto, como a pessoa sob o controle das regras nunca passou pelo “ajuste fino” das contingências, as suas respostas possivelmente não serão topograficamente semelhantes e, com certeza, não serão funcionalmente semelhantes às das pessoas que foram modeladas pelas contingências.

Uma questão essencial a respeito das contingências e das regras é que não há regras nas contingências. As regras são descrições verbais das contingências, o que não significa que as regras estejam nelas. É o caso da gramática: uma comunidade verbal manteve certas contingências de reforço acerca do comportamento verbal. Ao descrever essas contingências apresentamos o que seriam as regras gramaticais. Mas as regras não são as contingências – são apenas descrições de contingências (Skinner, 1989c).

Para ilustrar as diferenças entre comportamento governado por regras e comportamento modelado pelas contingências é interessante apresentar o exemplo dos quadros 2.6 e 2.7. Nesse caso, a única consequência reforçadora para a classe operante do sujeito seria o café com açúcar (situação 2). Na presença da máquina de café ele primeiramente apertou o botão 1, o que resultou no café sem açúcar (situação 1).

Mas havia outro botão na máquina, o botão 2, e ao apertá‑lo o sujeito obteve o café com açúcar (situação 2). Por razões que nos fogem, o sujeito 1 decidiu deixar um bilhete ao lado da máquina de café com as seguintes palavras: “Se quiser café com açúcar, aperte o botão 2”. Trata‑se de uma regra que descreve a contingência cuja consequência será reforçadora para quem quiser café com açúcar. Passou‑se um tempo e outro sujeito apareceu. O Quadro 2.7 indica a sequência do seu comportamento:

Skinner: Regras e contingências

Também para o sujeito 2, a única consequência reforçadora seria o café com açúcar. A máquina de café e o bilhete estabelecem a ocasião de sua resposta. O que se pode dizer sobre o sujeito 2? Possivelmente que sua resposta ficou sob controle da regra descrita no bilhete: se quiser café com açúcar, aperte o botão 2. É possível notar que o comportamento do sujeito 2 não é funcionalmente semelhante ao do sujeito 1, principalmente em suas condições de controle.

O sujeito 1 estava sob controle das contingências e o sujeito 2 sob controle da regra. Outra diferença é que, no caso do sujeito 1, a consequência reforçadora fortaleceu a classe operante que envolve apertar o botão 2 para conseguir café com açúcar na máquina de café em questão. Já no caso do sujeito 2, além da classe operante que envolve apertar o botão 2 para conseguir café com açúcar na máquina de café em questão, a consequência reforçadora pode fortalecer classes operantes que envolvem o seguir regras.

Ou seja, ficar sob o controle da regra “Se quiser café com açúcar, aperte o botão 2” resultou na consequência reforçadora para o sujeito 2, que pode, então, passar a seguir regras nos mais variados contextos, para além da situação do exemplo. Esse sujeito pode até mesmo criar uma “regra sobre seguir regras”, a saber: “Quando sigo regras, consequências reforçadoras são apresentadas. Sendo assim, devo sempre seguir regras”.

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REFERÊNCIAS:

A natureza comportamental da mente: behaviorismo radical e filosofia da mente / Diego Zilio. – São Paulo: Cultura Acadêmica, 2010.


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