Estudamos anteriormente a Psicanálise, que propõe um modo próprio de entender o psiquismo. Veremos, a partir de agora, um outro modelo de compreensão do ser humano, que toma como fenômeno central e objeto de estudo o comportamento. O termo Behaviorismo (que significa comportamentalismo, em inglês) foi instituído pelo norte-americano John B. Watson, no início do século XX.
Em oposição ao mentalismo (ênfase nos aspectos mentais) e ao método da introspecção, Watson propunha estudar aquilo que fosse possível observar e examinar por meio de procedimentos objetivos, característicos da ciência. Dentre os vários estudiosos que influenciaram as ideias de Watson, podemos citar o fisiologista russo Ivan Petrovich Pavlov (1849-1936), que criou a teoria do Condicionamento Clássico.
Condicionamento Clássico (ou Respondente)
Utilizando um equipamento adaptado ao seu estudo (Figura 3), Pavlov analisou o processo de salivação dos cães. Descobriu que era possível fazer com que um estímulo antes neutro (um som, por exemplo) provocasse salivação ao ser associado a um estímulo que gerava naturalmente essa reação (a comida) (CAMPOS, 2014; MATOS, 1993).
Pavlov postulou, ao longo de seus estudos, leis do condicionamento. Sobre uma delas, Campos (2014) refere que:
Determinado estímulo natural ou incondicionado, que provoque resposta específica, atuando simultaneamente com um estímulo neutro ou inespecífico, para a resposta em questão, poderá ser substituído por este, a fim de provocar idêntica reação. (CAMPOS, 2014, p. 186)
Com isso, pode-se entender que, por meio do pareamento de estímulos, é possível promover a mudança comportamental. O estímulo natural ou incondicionado é aquele que provoca determinada reação naturalmente, de forma automática. No experimento de Pavlov, o estímulo incondicionado é a comida (ou o seu cheiro). Por outro lado, o estímulo condicionado é aquele anteriormente neutro, mas que passa a provocar uma resposta em função da associação com um estímulo incondicionado.
No caso do experimento de Pavlov, o estímulo condicionado era o som, que após algum tempo de associação com a comida, passou a desencadear a salivação no cão. Em relação às leis do condicionamento, também é importante ressaltar que o caminho inverso é possível, ou seja, se um estímulo condicionado for apresentado diversas vezes sem o pareamento com o estímulo incondicionado, poderá, ao longo do tempo, perder a capacidade de provocar a reação aprendida.
A respeito disso, Campos (2014, p.186) diz: “Determinado estímulo condicionado, desde que atue, seguidamente, por algum tempo, sem que haja uma nova atuação conjunta com o estímulo natural, perderá sua capacidade de produzir a reação condicionada […]”. Como um exemplo de Condicionamento Clássico podemos citar uma pessoa, que iremos chamar de Pedro, que tem o comportamento de fumar sempre após as refeições tomando um cafezinho.
Pedro, por problemas de saúde, decide parar com o uso de cigarros e inicia um acompanhamento na Unidade Básica de Saúde. No entanto, ele tem tido grande dificuldade de manter-se abstinente e chegou a pensar que precisa parar de tomar café, pois todas as vezes que ingere a bebida sente grande vontade de fumar. Outras bebidas, como refrigerante ou sucos, não provocam a mesma reação. Nesse caso, é possível considerar que houve a associação entre dois estímulos, o cigarro e o café.
Antes de associar as duas substâncias, provavelmente Pedro não sentia vontade de fumar ao beber café. Mas, depois de usá-las juntas por um longo período, passou a fazer tal associação de modo involuntário. Provavelmente, se Pedro seguir tomando café sem fumar, o condicionamento irá se enfraquecer, até que ele não associe mais o café com o cigarro.
Atenção: no exemplo utilizado foi enfatizado apenas um aspecto da questão comportamental que envolve o tabagismo. Além dos comportamentais, fatores psicológicos e orgânicos também seriam levados em consideração em uma situação verídica.
Interatividade: no link https://www.youtube.com/ watch?v=JouMo26Bu9o você poderá assistir a um trecho do seriado Two And a Half Men (de Chuck Lorre e Lee Aronsohn) que apresenta, de maneira caricatural, um exemplo de condicionamento clássico.
Saiba mais: no cinema, um dos maiores clássicos acerca da temática do condicionamento é o filme “Laranja Mecânica” (de Stanley Kubrick), que narra uma história de violência e uma proposta de tratamento baseada no condicionamento para a mudança comportamental. Observe a classificação indicativa do filme, ou seja, a faixa etária a partir do qual é recomendada, pois contém cenas de sexo e violência.
Baseando-se nas ideias de Pavlov, Watson despendeu esforços para tornar a Psicologia uma ciência, rechaçou o estudo de tudo que não pudesse ser observável (como o inconsciente, os pensamentos, etc), equiparando o ser humano a uma “caixa-preta”, sobre a qual nada se pode afirmar. Segundo ele, o objeto de estudo da Psicologia deveria ser o comportamento. Quanto à definição de comportamento, considerava aquilo que pode ser registrado e quantificado. O comportamento era, para ele, resultante de estímulo(s) do ambiente.
Em função disso, o Behaviorismo ficou conhecido pela sua lógica E-R (Estímulo-Resposta, ou, em inglês S-R). À teoria de Watson deu-se o nome de Behaviorismo Metodológico (BAUM, 2006; CUNHA, 2002). O Behaviorismo Metodológico provocou repercussões e muitos seguidores. O mais conhecido de todos é Burrhus Frederic Skinner (1904-1990), que, seguindo algumas ideias de Watson e abandonando outras, propôs o Behaviorismo Radical, que tem como cerne o condicionamento operante.
Condicionamento Operante
Enquanto Watson se dedicou ao estudo dos comportamentos respondentes ou reflexos, Skinner estava interessado em compreender o processo de aprendizagem associado ao comportamento operante. Quanto às diferenças entre ambos, cabe explanar que:
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O comportamento respondente ou reflexo é aquele que “[…]usualmente chamamos de ‘não voluntário’ e inclui as respostas que são eliciadas (ou produzidas) por estímulos antecedentes do ambiente.” (BOCK; TEIXEIRA; FURTADO, 2008, p. 59). Pode ser inato ou aprendido. É o caso da salivação diante de um alimento, da tosse ao sentir um objeto na garganta ou do sobressalto instantâneo mediante um som muito alto e repentino.
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O comportamento operante é aquele “comportamento emitido espontânea ou voluntariamente que atua no ambiente para modificá-lo”, além disso, “a natureza e a frequência do comportamento operante serão determinadas ou modificadas pelo reforço que acompanha o comportamento” (SCHULTZ; SCHULTZ, 2015, p. 313). Como exemplos de comportamentos operantes podemos citar: falar, ler, escovar os dentes, entre outros.
Ao estudar esta segunda classe de comportamentos, Skinner formulou a teoria do Condicionamento Operante. E podemos garantir que, mesmo sem conhecê-la, você faz uso dela cotidianamente. Segundo a referida teoria, a ocorrência, ou não, de certo comportamento é determinada pelas suas consequências, que são chamadas de reforçadoras ou punidoras (aversivas).
As reforçadoras são aquelas que aumentam a frequência da ocorrência do comportamento que as produziu. Em contrapartida, as punidoras ou aversivas são aquelas que diminuem a frequência de tal comportamento (BOCK; TEIXEIRA; FURTADO, 2008). Você lembra que comentamos, no início desta unidade, que é comum que o conhecimento do senso comum se aproprie dos saberes da ciência?! As ideias de Skinner são um exemplo disso.
Os termos reforço e punição são frequentemente utilizados quando se trata da mudança comportamental. Só temos que ter cuida[1]do, pois é corriqueiro que haja uma confusão em relação aos termos, principalmente quando se fala em reforço negativo.
Saiba mais: a teoria de Skinner teve grande influência dos estudos e da “Lei do Efeito”, proposta pelo psicólogo americano Edward Lee Thorndike (1874-1949). Para conhecer um pouco das ideias de Thorndike, assista ao vídeo “Thorndike Puzzle Box” acessando o link https:// www.youtube.com/watch?v=ygLYDJji8J4.
Uma consequência pode ser reforçadora (aumentar a probabilidade de ocorrência do comportamento) por representar algo agradável. Ou pode ser reforçadora por significar a retirada de algo desagradável. No primeiro caso, estamos falando de reforço positivo; no segundo, de reforço negativo. É comum que as pessoas confundam reforço negativo com punição. Mas, lembre-se, o reforço é aquilo que aumenta a probabilidade de ocorrência do comportamento que o causou e a punição diminui tal probabilidade.
A punição também pode ser positiva ou negativa. A punição positiva ocorre quando algo desagradável acontece em função de determinado comportamento, o que acaba fazendo com ele ocorra cada vez menos. Já a punição negativa se caracteriza pela retirada de algo agradável como forma de reduzir a ocorrência do comportamento.
Exemplos:
Reforço positivo: um estudante que costuma se dedicar pouco às atividades apresenta um trabalho demonstrando grande esforço e empenho e o professor mostra-se satisfeito e o parabeniza. (Tende a aumentar a ocorrência do comportamento pela apresentação de um estímulo agradável).
Reforço negativo: um presidiário que mantém um bom comportamento para que sua pena seja reduzida. (Tende a aumentar a ocorrência do comportamento pela retirada de um estímulo desagradável).
Punição positiva: um motorista que dirige acima do limite de velocidade e recebe uma multa. (Tende a diminuir a ocorrência do comportamento pela apresentação de um estímulo desagradável).
Punição negativa: os pais proíbem o filho de jogar videogame, pois ele não estudou para a prova. (Tende a diminuir a ocorrência do comportamento pela retirada de um estímulo agradável).
Na Figura 4 você pode visualizar um esquema acerca dos conceitos.
Tipos de estímulos reforçadores
Não é possível definir, a priori, se um estímulo é reforçador ou não. Isso porque depende de características individuais e sociais. Não se sabe, por exemplo, qual o efeito que a competitividade pode ter sobre cada um. Ao estimular a competição entre a turma, o professor pode estar incentivando alguns estudantes a se dedicarem mais, ao mesmo tempo em que pode estar contribuindo para que outros evitem o estudo e vejam a escola como um ambiente aversivo.
O que se quer dizer com isso é que o efeito da consequência de um comportamento é variável, dependendo de cada indivíduo. Apesar disso, considera-se que alguns estímulos são propensos a serem reforçadores para todos os seres de uma espécie. A água, o alimento, ruídos muito fortes e odores desagradáveis são alguns exemplos. Esses são denominados de estímulos reforçadores primários. Já os estímulos reforçadores secundários são aqueles que, antes neutros, passam a ter o caráter reforçador por estarem associados a reforçadores primários.
Para exemplificar, pense no hábito de dar flores. Flores não tendem a ser naturalmente reforçadoras, mas ao estarem associadas à expressão de afeto (reforçador primário) passam a apresentar um potencial reforçador. Por fim, há os reforçadores generalizados. Assim chamados porque estão associados a vários reforçadores primários. Um exemplo é o dinheiro, ele está associado à obtenção de vários outros reforçadores. E é, como os secundários, aprendido.
O Behaviorismo e a educação
Ao elucidar os princípios que regem a aquisição de comportamentos aprendidos, bem como os elementos necessários à mudança do repertório comportamental, o Behaviorismo se tornou bastante conhecido e aplicado na área da educação. Apresentamos, a seguir, no quadro 2, algumas das principais contribuições desta abordagem para as práticas educacionais, a maioria delas relacionadas à proposta da instrução programada (CAMPOS, 2014; CÓRIA-SABINI, 1986; HENKLAIN; CARMO, 2013):
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O conteúdo a ser ensinado deve ser subdivido em pequenas partes, distribuídas em uma sequência lógica que possibilite a passagem gradual de uma etapa à outra. É importante o uso de reforçadores ao longo de todo processo e não apenas no final.
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O uso de reforçadores é de grande importância para o processo de aprendizagem escolar, mas deve-se ter cuidado com o excesso de punição, pois tende a levar à esquiva (evitação).
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Cada estudante tem seu próprio ritmo de aprendizagem e esse deve ser respeitado.
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O ensino deve ser pensado de modo que apresente conhecimentos futuros úteis. “Para Skinner, educar é estabelecer comportamentos que serão vantajosos para o indivíduo e para os outros no futuro.” (CÓRIA-SABINI, 1986, p. 12).
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O planejamento é uma etapa muito importante no processo de ensinar. O professor precisa ter clareza a respeito do que deve ser ensinado, quais reforços poderá utilizar e de que forma empregá-los, quais os comportamentos prévios são necessários para o alcance dos objetivos, ou seja, o que o aluno já precisa saber para poder seguir adiante.
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A avaliação é um elemento muito útil, por alguns motivos: “o erro indica ao professor que o seu procedimento de ensino não está sendo efetivo e que algo em seu planejamento de ensino precisa ser revisto” (HENKLAIN; CARMO, 2013, p. 716), além disso, uma sucessão de erros pode desestimular o aluno (se você se dedicar, estudar, prestar atenção e, ainda assim errar, vai ter motivação para seguir estudando?).
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O professor deve estimular uma atitude ativa por parte do estudante, ou seja, que o estudante participe das atividades e não seja um mero receptor de informações. Isso permite que o professor perceba se o aluno está aprendendo e quais suas dificuldades e também possibilita o uso de reforçadores. Mas lembre-se: reforçar não é sinônimo de elogiar. Pode-se reforçar positivamente, por exemplo, dedicando atenção ao aluno, mostrando-se interesse por suas opiniões.
Skinner acreditava que, do modo como a escola está estruturada em nossa sociedade, com turmas numerosas, seria inviável que um professor colocasse em prática seu método de ensino. Ele propôs, então, o uso de máquinas de ensinar. “Essas máquinas são equipamentos que fornecem as informações necessárias, exigem as respostas dos alunos e corrigem-nas imediatamente, reforçando-as quando corretas ou indicando o erro com oferecimento de informações complementares” (CÓRIA-SABINI, 1986, p. 13).
Quando Skinner fez esta proposição, a tecnologia não era tão avançada como nos dias de hoje. Observe a Figura 5 e veja uma das primeiras máquinas de ensinar, apresentada em 1954. Atualmente, muitas escolas fazem uso de computadores com uma proposta semelhante à do autor.
Interatividade: para saber mais a respeito das contribuições de Skinner à educação, assista ao vídeo “Skinner – Coleção Grandes Educadores” no link https://www.youtube.com/ watch?v=L_iD-JPI99Q
Interatividade: assista ao vídeo “Skinner fala sobre a máquina de ensinar” no link https://www.youtube.com/ watch?v=vmRmBgKQq20
O uso de equipamentos, na visão de Skinner, não tira a importância e nem substitui o professor. O psicólogo via muitas vantagens no uso de máquinas de ensinar, dentre elas: o estímulo ao papel mais ativo por parte do estudante, a possibilidade de cada indivíduo seguir seu ritmo de aprendizado, a utilização de reforços imediatos, a facilidade no uso de reforços individualizados, a facilidade em conhecer os erros e acertos de cada um, entre outros (CAMPOS, 2014). Assim como a Psicanálise, o Behaviorismo também gerou, e ainda gera, muitas controvérsias.
Há aqueles que o acusam de conceber o ser humano de modo mecanicista, reducionista e determinista, além de rebaixar os seres humanos por ter se utilizado de estudos com animais. Por outro lado, seus defensores alegam que esses argumentos são frutos do desconhecimento aprofundado das teorias. Determinar quem está certo não nos cabe. O que podemos afirmar, com certeza, é que Skinner e seus seguidores têm tido, ao longo da história, grande influência sobre as práticas escolares.
Título : Psicologia do desenvolvimento e da aprendizagem
Autoras : Josieli Piovesan, Juliana Cerutti Ottonelli , Jussania Basso Bordin e Laís Piovesan
Fonte: Psicologia do desenvolvimento e da aprendizagem [recurso eletrônico] / Josieli Piovesan … [et al.]. – 1. ed. – Santa Maria, RS : UFSM, NTE, 2018.
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