Os covardes, para ele, eram aqueles que escorados na má fé, inventam determinismos, de que não podem fazer diferente daquilo que fazem, recusando-se aceitar a total liberdade que implica risco nas decisões.
Há também os safados que são aqueles que tentam demonstrar que sua existência era necessária, quando ela é a própria contingência do aparecimento do homem na terra.
Ao se apartar deste tipo de ‘modelos’ dominantes da cultura, Sartre optou ser só, no único que define o rosto humano, o engajamento na ação, na direção do que se acredita para nós e para os outros.
O existencialismo será um filosofia da ação e do engajamento, contra o “quietismo”, dizia Sartre, e contra a unanimidade, que Nelson Rodrigues, influenciado pelo existencialismo, chamava “burra”.
Que vida Sartre se fez para si?
Um homem que se decidiu a ser completamente sozinho. Uma vez condenado à existência, porque o homem será o que se fizer dele próprio. Sartre fez-se só em centenas de situações públicas de sua vida longe de unanimidade. Perguntemos, não deveria, por isso, ter terminado sozinho com sua escolha pessoal? Fechado, por isso, num projeto de vida individual, medíocre e narcisista? Esquecido e voltado para seu próprio universo onde ele começava e nele terminava?
“Ao queremos a liberdade pela liberdade e através da cada circunstância particular […] descobrimos que ela depende inteiramente da liberdade dos outros, e que a liberdade dos outros depende da nossa. […] a liberdade como definição do homem não depende de outrem, mas, uma vez que existe a ligação de um compromisso, sou obrigado a querer ao mesmo tempo a minha liberdade e a liberdade dos outros; só posso tomar a minha liberdade como um fim se tomo igualmente a dos outros como um fim […].”
(Sartre – O existencialismo é um humanismo)
É possível julgar uma vida?
“Não há meio algum para julgar. O conteúdo é sempre concreto e por conseguinte imprevisível; há sempre invenção. A única coisa que conta é saber se a invenção que se faz, se faz em nome da liberdade.”
(Sartre – O existencialismo é um humanismo)
Sartre sendo ele mesmo, sua vida foi um grande emblema para a pessoas insatisfeitas com as mentiras, convenções, artificialismo e violência. Sua vida foi de grande referência, como sua obra. Sartre só, foi muito mais do que somente a vida de um homem sozinho. Sua vida teve eco nas multidões.
Ao contrário da imensa maioria dos homens no planeta, aquele que não tinha uma religião, deixou a vida não tendo um partido, tendo poucos amigos, cego, com falência dos órgãos, carregava no seu corpo seus sonhos, e o projeto de vida de quase toda a humanidade.
Por isso, seu enterro, em Paris, representou o ato público de protesto do qual tomava parte, um levante contra a frivolidade do poder, foi acompanhado por mais de cinquenta mil pessoas que choraram sua morte. Quem sabe valeu ter primeiro arriscado a viver pelo que acreditava, e, somente por causa da vida, ter tido a coragem de filosofar.
Tantos pensaram a vida de Sartre como um desesperançado, sem amor.
Sartre amou?
Ele próprio responde:
“Para o existencialista não há amor diferente daquele que se constrói; não há possibilidade de amor senão a que se manifesta no amor, não há gênio senão o que se manifesta na obra de arte; o gênio de Proust é a totalidade das obras de Proust […] o que queremos dizer é que um homem nada mais é do que uma série de empreendimentos, que ele é a soma. […] um covarde se construiu covarde pela soma dos seus atos”.
(Sartre – O existencialismo é um humanismo)
Tomo como referência a cronologia realizada por Luciano Donizetti da Silva, publicada na revista Discutindo Filosofia:
Na vida está jogado tudo. Ali se é tudo ou nada. Não há lugar para neutralidade. Temos que decidir o que fazer de nossa vida, sem má fé, sem safadeza e sem covardia. Não escolher é já uma escolha diz Sartre. Escolha sem volta. Preciso aceitar limites, por exemplo, que os outros possam ser livres. Neste sentido, é possível que outros, depois de mim, poderão escolher um projeto que julgo mal para a humanidade, porque também eles são livres.
REFERÊNCIAS:
Fundamentos de Filosofia: os caminhos do “Pensar” para quem quer transformação / Luiz Augusto Passos. — 1ª ed., 1ª reimp. — Brasília/DF: Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação, 2014.