Analisar o problema ontológico e o problema conceitual da mente pela óptica do behaviorismo radical pode parecer, à primeira vista, uma tarefa impossível. Afinal, tal como comumente se supõe, o behaviorismo radical seria uma psicologia “sem mente”, e, se não há mente, não há problemas.
Entretanto, antes de qualquer conclusão precipitada sobre esse tema, é preciso entender o que é o behaviorismo radical. Skinner (1974, p.3) afirma que o “behaviorismo não é a ciência do comportamento humano; é a filosofia dessa ciência”. Mas o que caracteriza essa filosofia da ciência? Em outro texto, Skinner (1963a, p.951) desenvolve a questão:
O behaviorismo […] não é o estudo científico do comporta‑ mento, mas a filosofia da ciência preocupada com o objeto de estudo e com os métodos da psicologia. Se a psicologia é a ciência da vida mental – da mente, da experiência consciente – então ela precisa desenvolver e defender uma metodologia especial, o que ainda não foi feito com sucesso. Se ela é, por outro lado, a ciência do comportamento dos organismos, humanos ou não humanos, então ela é parte da biologia, uma ciência natural para a qual métodos testados e altamente bem-sucedidos estão disponíveis.
O behaviorismo radical é uma filosofia da ciência cujo foco de análise é o objeto de estudo e os métodos da psicologia e, para Skinner, o objeto de análise da psicologia é o comportamento e os métodos adequados para o seu estudo são os apresentados pelo behaviorismo radical. Assim, a psicologia seria a ciência do comportamento – uma ciência que pode ser enquadrada no âmbito das ciências naturais.
Entretanto, nessa passagem, Skinner parece apresentar a “ciência da mente” e a “ciência do comportamento” como duas possibilidades de definição da psicologia, o que poderia induzir, por sua vez, algum tipo de dualismo entre mente e comportamento de acordo com o qual, se optarmos por estudar o comportamento, devemos deixar a mente de lado e vice‑versa. Essa não é, contudo, a posição behaviorista radical.
Para Skinner (1974, p.211), a ciência do comportamento deve apresentar “uma explicação alternativa da vida mental”. Essa tarefa, inclusive, constitui “o âmago do behaviorismo radical” (Skinner, 1974, p.212). Ou seja, sendo a ciência do comportamento, a psicologia não poderá deixar espaço para uma ciência da mente autônoma. O behaviorismo radical, portanto, não sustenta uma psicologia “sem mente”, mas uma psicologia que apresenta um tratamento próprio dos fenômenos normalmente caracterizados como “mentais”.
Especificamente, para Skinner (1987b, p.784), “a mente é o que o corpo faz. É o que a pessoa faz. Em outras palavras, ela é comportamento”. Sendo assim, talvez seja possível buscar na obra de Skinner os fundamentos para a construção da teoria behaviorista radical da mente. Para tanto, será preciso apresentar pormenorizadamente as características do behaviorismo radical. Essa apresentação deverá conter:
- Uma definição do objeto de estudo da psicologia, isto é, do comportamento – se a mente é comportamento, precisamos saber, então, o que é comportamento.
- A apresentação do behaviorismo radical enquanto filosofia da ciência do comportamento.
- As principais características do behaviorismo radical enquanto sistema de explicação/interpretação do comporta‑ mento.
- O detalhamento da teoria dos eventos privados e da teoria do conhecimento propostas por Skinner, visto que elas são imprescindíveis para lidar com alguns temas da filosofia da mente (e.g., subjetividade, conhecimento privilegiado, consciência e experiência).
Cumprir essas exigências é o principal objetivo do capítulo 2. Espera‑se, acima de tudo, que a análise do behaviorismo radical enquanto filosofia da ciência, somada à avaliação da teoria do comportamento desenvolvida a partir de seus parâmetros, proporcione uma base sólida para a discussão dos problemas da mente debatidos no âmbito filosófico.
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REFERÊNCIAS:
A natureza comportamental da mente: behaviorismo radical e filosofia da mente / Diego Zilio. – São Paulo: Cultura Acadêmica, 2010.