O Papel do Pedagogo na Gestão: Possibilidades de Mediação do Currículo

Mariana F. Taques

Paulla Helena S. de Carvalho

Ana Carolina S. Duarte Böni

Elisane Fank

Marilda Alberton Leutz

O Papel do Pedagogo na Gestão: Possibilidades de Mediação do CurrículoResumo

O presente texto, ainda que não tenha intenção de esgotar a discussão, pretende trazer ao debate o papel do pedagogo na gestão – democrática – escolar e na mediação do currículo como expressão da intencionalidade da escola em função dos seus sujeitos. Portanto, aponta brevemente a Gestão Democrática como possibilidade de organização do trabalho da escola pública pela via do currículo e do Plano de Trabalho Docente, como evidência da atividade teleológica da escola.

Gestão da Educação: o papel da direção e da equipe pedagógica na Gestão Democrática da escola

As evidentes mudanças científico-tecnológicas, econômicas, sociais, políticas e culturais ocorridas no mundo contemporâneo têm influenciado direta e indiretamente a organização da sociedade que concretamente reflete em seus processos educacionais. Em sincronia com essas mudanças, que já vêm de outrora, a organização da educação mediada por essas relações refletiu em contextos históricos diferentes, formas de desenvolvimento, gestão pedagógica e administrativa, buscando referências nos mais variados espaços de composição social.

Tomando o contexto histórico da década de 70, situou-se a escola, e especialmente a sua gestão, sob a ótica da “administração empresarial, produzindo-se em relação ao currículo, bem como ao modo de organizar a escola e avaliar o desempenho dos professores e alunos, experiências que permitiram identificar de modo mais generalizado e, também, de modo mais particular, a tendência em curso” (Rosar, 1999, p.166), que tendia para uma educação massificadora, cuja intencionalidade se firmava na formação da força de trabalho do mercado em desenvolvimento.

Deste modo, a gestão escolar, baseada em um modelo burocratizado e tecnizado reforçava a tese, ou melhor, a prática da divisão do trabalho, configurando a escola como espaço legitimador da ideologia mercadológica e do trabalho fragmentado. Para o contexto histórico situado cabia a homogeneização dos currículos, a padronização das formas, a hierarquização das atividades e, sobretudo, a formação em massa de sujeitos, possíveis reprodutores da lógica vigente.

Contudo, o movimento da própria história mobilizou, na tentativa de deslocar o conceito burocrático de gestão, especialmente na década de 80, um conjunto de ações em prol da escola pública e democrática, abarcado pela Constituição Federal de 88, que determinava em seus artigos, a saber:

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:

I – igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;

II – liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;

III – pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas, e coexistência de instituições públicas e privadas de ensino;

IV – gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais;

V – valorização dos profissionais da educação escolar, garantidos, na forma da lei, planos de carreira, com ingresso exclusivamente por concurso público de provas e títulos, aos das redes públicas;

VI – Gestão Democrática do ensino público, na forma da lei;

VII – garantia de padrão de qualidade.

Assim sendo, esta década de recessão econômica de um lado e, de outro, de fortalecimento da resistência ao trabalho pedagógico instituído, as políticas educacionais em voga (e, portanto, ideológicas) redefiniram, ou tentaram redefinir o curso da escola pública, ampliando as possibilidades e debates em torno do conceito e práticas democráticas de gestão da educação.

Não obstante, obscurecido pelo processo de reorganização do modus operandi, iniciado ao final da década de 80 e fortalecido na década de 90, as formas de gestão da educação, respaldadas pela política pública do período, retomam as discussões da gestão administrativa e gerencialista da educação, optando pela “moderna teoria da administração educacional, mais uma vez atualizada a transposição das teorias e práticas empresarias renovadas pelas imposições do processo produtivo” (Idem, p. 173).

Esta noção, transportada do mercado de trabalho, vai delimitar para a escola a chamada Gestão Compartilhada, entendida nos moldes da Gestão da Qualidade Total, subsumindo a escola aos “valores” da produtividade e eficiência. Contudo, de acordo com Rosar (1999),

essa ação massiva de convencimento ideológico acionada pelo governo tem obtido repercussões limitadas na prática dos diretores, pedagogos e professores das escolas de educação básica, mesmo quando reproduzem a terminologia veiculada. A indagação que daí decorre é: por que não pode ser hegemônica essa concepção, no âmbito do sistema educacional? (p. 173)

Responderemos com a prerrogativa de pensar que estamos nos mobilizando em favor da escola pública e, portanto, remetendo-nos à formação dos alunos desta escola. Ocorre, pois, que o conceito de gestão aqui defendido extrapola o âmbito da organização de poder, para ser compreendido como condição de organização do espaço público de ensino, no compromisso coletivo de formação e humanização dos sujeitos.

Assim, Gestão Democrática da educação compreende a noção de cidadania como “capacidade conquistada por todos os indivíduos, de se apropriarem dos bens socialmente criados, de atualizarem todas as potencialidades de realização humana abertas pela vida social em cada contexto histórico determinado”. (Coutinho, 2000, p: 50)

Além disso, conforme Ferreira (1999, p. 1241)

Gestão significa tomar decisões, organizar, dirigir as políticas educacionais que se desenvolvem na escola comprometidas com a formação da cidadania […] é um compromisso de quem toma decisões – a gestão, de quem tem consciência do coletivo – democrática – de quem tem responsabilidade de formar seres humanos por meio da educação.

E pensar em Gestão Democrática da escola pública remete, obrigatoriamente, pensar a possibilidade de organicamente constituir a escola como espaço de contradição. E o que possibilita isso? Primeiramente delimitar os processos de organização dos segmentos escolares diante do seu papel na escola pública.

Entender que decisões quanto a finalidades e conteúdos devem ser tomadas para humanização da formação dos sujeitos, o que significa pensar em quais conteúdos da aprendizagem serão ensinados como conteúdos de vida e que devem abranger os conceitos científicos da cultura erudita e os conteúdos da prática social. (id. p.1238). A Gestão Democrática passa a ser vista sob o ponto da organização coletiva da escola em função dos seus sujeitos.

Organizar-se coletivamente exige rigor teórico-prático de quem organiza, decide, dirige, debate, discute a organização escolar. Significa permitir o trabalho específico e ao mesmo tempo, orgânico dos sujeitos em função das necessidades histórico-sociais dos seus alunos. Nesse ínterim, tomaremos aqui, em especial, a possibilidade de trabalho do pedagogo, na tentativa de entender seu papel como mediador da intencionalidade educativa da escola, pela via dos diferentes segmentos que a compõe.

Na perspectiva a histórico-crítica, insere-se a preocupação de se preparar a classe trabalhadora para ser dirigente e, após esse processo, tornar-se dominante, como defendeu Gramsci. “A apropriação concreta do saber objetivo, articulando com os interesses da classe trabalhadora, reforça e amplia a luta hegemônica da classe e à esta articulação que a coloca no caminho de ser dirigente antes de governante” (Prais, 1994, p. 41).

Porém, para alcançar esse nível de discussão e apropriação do discurso e ideais desta perspectiva, supõe um movimento de unidade da dimensão política e técnica de nossa prática que, obrigatoriamente, se articula com um conjunto de práticas sociais. A escola, como instituição social, que tem como função a democratização dos conhecimentos produzidos historicamente pela humanidade, é um espaço de mediação entre sujeito e sociedade.

Compreender a escola como mediação significa entender o conhecimento como fonte para efetivação de um processo de emancipação humana e, logo, de transformação social. O que implica em ver o papel político da escola atrelado ao seu papel pedagógico e, mais, dimensionar a prática pedagógica, em todas suas características e determinantes com intencionalidade e coerência, o que transparece um compromisso político ao garantir que o processo de ensino e aprendizagem esteja a serviço da mudança necessária.

“Assim, a escola progressista denuncia a não diretividade como instrumento de dominação, resgatando a ação diretiva do educador que representa a ruptura com o que foi socialmente determinado e promove a formação coletiva do educando” (Prais, 1994, p. 42). Neste ínterim, supõe-se que, na medida em que a Gestão Democrática (colegiada) define coletivamente as ações e as concepções da escola, ela passa a constituir-se numa condição determinada e determinante de uma teoria e prática progressista de educação, principalmente, quando essa gestão vem como uma necessidade histórica.

Saviani (2007) afirma que a sociedade brasileira, a partir de 1982, vive em consequência das contradições advindas da “ampliação de poder autocrático e pela superexploração do grande capital monopolista, o que se convencionou chamar de transição democrática, resultante da reorganização e repolitização das classes trabalhadoras”.

Diante de tal situação, aparecem indicativos de um novo quadro de mobilização e organização social, que instigam mudanças nas relações de poder em todas as áreas, e não seria diferente na educação. Sendo assim, justifica-se a adoção da Gestão Democrática hoje, pela escola pública, por ser uma forma de organização da escola que, parece no momento, poder dar suporte às necessidades escolares atuais, no que diz respeito à organização, participação, planejamento e tomada de decisão.

A participação de fato é uma prática política e, por natureza, democrática. Visão esta que, na escola, exige obrigatoriamente a mudança do papel do diretor. Primeiramente, quanto à fragmentação do seu trabalho, entre administrativo e pedagógico e, em seguida, a mudança de postura no que diz respeito à centralização das tomadas de decisão, corporativismo e autoritarismo, além de seu caráter exclusivamente gerencialista.

A superação destas características na direção de uma escola não é, simplesmente, utilização de termos diferentes no discurso, é assumir um projeto de gestão, interligado com projeto de educação, de sociedade, de homem, de mundo.

A Gestão Democrática na escola se constitui em processo coletivo de decisões e ações, e consequentemente, possibilita recuperar o papel do diretor na liderança do processo educativo e não como peça exclusiva do mesmo. Paro (2005, p. 73-74) discorre sobre o papel do diretor:

Em termos práticos, as atividades de direção restringem-se ao diretor – e aos assistentes de diretor, sem coadjuvante no comando da escola. Mas estes também acabam se envolvendo em atividades rotineiras que pouco têm a ver com uma verdadeira coordenação do esforço do pessoal escolar com vistas à realização de objetivos pedagógicos. Concorrem para isso, em grande medida, as precárias condições de funcionamento da escola […]. Diante desse quadro, não é difícil imaginar as dificuldades da direção em coordenar esforços de pessoas cujas atividades dependem de recursos inexistentes.

No enfrentamento dos problemas do cotidiano escolar, o diretor, ou equipe diretiva, tem impasses que dificultam seu trabalho como gestor. E, no caso do diretor centralizador, o caso fica ainda mais grave, já que será o único a analisar, propor ações e implementar os encaminhamentos necessários ao enfrentamento dos problemas escolares.

Porém, com a gestão democrática, parte-se do princípio que, o diretor não estará sozinho nem para decidir nem para agir. Percebam que a Gestão Democrática não é sinônimo de “todo mundo faz tudo”, ou “qualquer um faz qualquer coisa”. Cada sujeito do processo educativo tem suas funções específicas, porém, o planejamento e implementação das ações parte do coletivo.

Portanto, a legitimidade da Gestão Democrática se dá nos processos de participação efetiva. Um dos princípios é a eleição de diretores, não que a mesma garanta a democracia como prática escolar, mas é um momento de tomada de decisão de toda a comunidade escolar. E, após a escolha do candidato, ele tem o dever, dentro dos princípios democráticos, de legitimar o processo educativo, a princípio, entendendo a escola como instituição de caráter pedagógico. Libâneo (2004, p. 29) afirma:

Ao meu ver, a Pedagogia ocupa-se, de fato, dos processos educativos, métodos, maneiras de ensinar, mas antes disso ela tem um significado bem mais amplo, bem mais globalizante. Ela é um campo de conhecimentos sobre a problemática educativa na sua totalidade e historicidade e, ao mesmo tempo, uma diretriz orientadora da ação educativa. O pedagógico refere-se a finalidades da ação educativa, implicando objetivos sociopolíticos a partir dos quais se estabelecem formas organizativas e metodológicas da ação educativa.

Essa visão faz com que a direção esteja sim, envolvida com a equipe pedagógica nos encaminhamentos pedagógicos que se fizerem necessários e explicitados no Projeto Político-Pedagógico da escola. O Projeto Político-Pedagógico é um instrumento que descreve e revela a escola, para além de suas intenções e concepções, é uma forma de organizar o trabalho pedagógico da escola.

A responsabilidade da construção deste projeto de sociedade e de educação é de toda comunidade escolar, sendo um “processo democrático de decisões, preocupa-se em ministrar uma forma de organização do trabalho pedagógico que supere os conflitos, buscando eliminar as relações competitivas, corporativas e autoritárias, rompendo com a rotina do mundo impessoal e racionalizado da burocracia que permeia as relações no interior da escola […] (Veiga, 1995, p.13).

O diretor dirige um Projeto Político-Pedagógico, como identidade de uma instituição e sua coletividade. A relação entre o projeto de sociedade e de educação com os projetos individuais de cada aluno, professor, pai, funcionário, instaura no Projeto Político-Pedagógico fundamentos para o exercício da participação democrática, das ações coletivas, da organização pedagógica e administrativa e o próprio resgate da função social da escola na apropriação dos conhecimentos.

Portanto, diante do Projeto Político-Pedagógico, como construção coletiva da identidade da escola, espera-se do diretor “capacidade de saber ouvir, alinhavar ideias, questionar, interferir, traduzir posições e sintetizar uma política de ação com propósito de coordenar efetivamente o processo educativo, o cumprimento da função social e política da educação escolar […]” (Prais, 1990, p. 86).

O papel do diretor é, predominantemente, gestor e administrativo, mas sempre com enfoque pedagógico, uma vez que se refere a uma instituição e a um projeto que existem em prol da educação.

Libâneo (2004) caracteriza algumas das funções da Direção na Gestão Democrática escolar:

  • dirigir e coordenar o andamento do trabalho pedagógico da escola, de acordo com sua função social;
  • assegurar o processo participativo na tomada de decisão e na sua implementação;
  • assegurar a implementação de todas as ações planejadas coletivamente;
  • articular e criar momentos para relações entre escola e comunidade escolar;
  • dar suporte às atividades de planejamento e discussão do currículo, juntamente com a equipe pedagógica, bem como fazer o acompanhamento e avaliação da prática pedagógica.

Diante destes apontamentos, fica clara a relação intrínseca do papel do diretor e do pedagogo na gestão escolar, pois o pedagogo responde pela mediação, organização, integração e articulação do trabalho pedagógico. Portanto, sugere a própria compreensão de que ser pedagogo significa ter o domínio sistemático e intencional das formas (métodos) por meio dos quais se deve realizar o processo de formação cultural. (Saviani, 1985).

Assim, se a pedagogia estuda as práticas educativas tendo em vista explicitar finalidades, objetivos sociopolíticos e formas de intervenção pedagógica para a educação, o pedagógico se expressa, justamente, na intencionalidade e no direcionamento dessa ação. Esse posicionamento é necessário, porque as práticas educativas não se dão de forma isolada das relações sociais, políticas, culturais e econômicas da sociedade (Libâneo, 2004).

E, embora saibamos que o papel do pedagogo tem sido alvo de muitas discussões, na perspectiva que temos defendido, a este profissional não cabe mais a lógica economicista, reproduzindo a fragmentação das relações de trabalho, assim como acontece na dualização do profissional pedagogo em supervisor e orientador.

Para tanto, cabe-nos questionar os que ainda agem e defendem a lógica tecnicista, na qual o supervisor controla o trabalho dos professores, em questões burocráticas e não de ensino e aprendizagem e o orientador recorre ao assistencialismo aos alunos e às famílias. Sobre a secundarização do papel do pedagogo, citemos Saviani (1985, p. 28):

Na verdade, tal desvio é hoje regra em nossas escolas: da exaltação aos movimentos de 64 à curiosidade pelo índio, da veneração às mães às festas juninas, das homenagens aos soldados ao cultivo do folclore e às loas à criança, encontra-se tempo para tudo na escola. Mas muito pouco tempo é destinado ao processo de transmissão-assimilação de conhecimentos elaborados cientificamente. Cumpre reverter essa situação. Vocês, pedagogos, têm uma responsabilidade grande nesse esforço de reversão. Enquanto especialistas em pedagogia escolar cabe-lhes a tarefa de trabalhar os conteúdos de base científica, organizando-os nas formas e métodos mais propícios à sua efetiva assimilação por parte dos alunos.

Para além da função pedagógica de interlocução com o corpo docente para efetivação de uma prática pedagógica que cumpre com os pressupostos conceituais e práticos expostos no Projeto Político Pedagógico (e Proposta Pedagógica Curricular), há a função do pedagogo na gestão escolar. Ou seja, a função da Equipe Pedagógica encontra-se maximizada no processo educativo agindo em todos os espaços para a garantia da efetivação de um projeto de escola que cumpra com sua função política, pedagógica e social.

O reconhecimento e efetivação do papel do pedagogo dependem do reconhecimento da intencionalidade e especificidade do trabalho pedagógico junto a toda comunidade escolar. Portanto, o envolvimento do pedagogo com questões do dia-a-dia escolar não deve extrapolar seu tempo e espaço do fazer pedagógico, já que problemas de disciplina, acompanhamento de entrada e saída de alunos, etc, são problemas da escola e o seu coletivo deve planejar ações para enfrentamento destas questões.

Para Gadotti (2004), “fazer pedagogia é fazer prática teórica por excelência. É descobrir e elaborar instrumentos de ação social. Nela se realiza de forma essencial, a unidade entre teoria e prática. […] O pedagogo é aquele que não fica indiferente, neutro, diante da realidade. Procura intervir e aprender com a realidade em processo. O conflito, por isso, está na base de toda a pedagogia.” Percebe-se aqui o pedagogo como articulador do trabalho coletivo da escola, articula a concepção de educação da escola às relações e determinações políticas, sociais, culturais e históricas.

Assim sendo, o pedagogo, à luz de uma concepção progressista de educação, tem sua função de mediador do trabalho pedagógico, agindo em todos os espaços de contradição para a transformação da prática escolar. Porém, baseado nesta concepção, sua atuação se faz para a garantia de uma educação pública e de qualidade visando a emancipação das classes populares.

Frente à defesa do papel do pedagogo, a Secretaria de Estado da Educação do Paraná, no edital nº 10/2007 de seleção para o concurso público, indica princípios da participação do pedagogo na gestão escolar:

  • Coordenar a elaboração coletiva e acompanhar a efetivação do Projeto Político-Pedagógico e do Plano de Ação da Escola;
  • promover e coordenar reuniões pedagógicas e grupos de estudo para reflexão e aprofundamento de temas relativos ao trabalho pedagógico e para a elaboração de propostas de intervenção na realidade da escola;
  • participar e intervir, junto à direção, da organização do trabalho pedagógico escolar no sentido de realizar a função social e a especificidade da educação escolar;
  • sistematizar, junto à comunidade escolar, atividades que levem à efetivação do processo ensino e aprendizagem, de modo a garantir o atendimento às necessidades do educando;
  • participar da elaboração do projeto de formação continuada de todos os profissionais da escola e promover ações para a sua efetivação, tendo como finalidade a realização e o aprimoramento do trabalho pedagógico escolar;
  • analisar as propostas de natureza pedagógica a serem implantadas na escola, observando a legislação educacional em vigor e o Estatuto da Criança e do Adolescente, como fundamentos da prática educativa;
  • coordenar a organização do espaço-tempo escolar a partir do Projeto Político-Pedagógico e da Proposta Pedagógica Curricular da Escola;
  • orientar a comunidade escolar na proposição e construção de um projeto pedagógico numa perspectiva transformadora.

Ademais, o papel do pedagogo legitima-se não tão somente na mediação da gestão escolar, mas no movimento de organização do currículo pela via da gestão.

O papel da equipe pedagógica na mediação do currículo como expressão da concepção de educação e projeto social

Todo projeto de educação expressa, sobretudo, um projeto social. É com essa premissa que o papel da escola, do conhecimento e, por sua vez, do currículo deve ser situado. A escola, historicamente, vem sendo o palco e o alvo de disputa de interesses distintos, os quais, por sua vez, expressam a organização dual da nossa sociedade, própria da forma de organização econômica sob e no capitalismo. Isso implica em dizer que a forma de organização social pautada na acumulação dos bens, na propriedade privada, na obtenção do lucro e, consequentemente, na reprodução das classes sociais, condiciona e tem condicionado, historicamente, o sentido da escola.

A escola está e, ao mesmo tempo, não está em crise, ela revela e, ao mesmo tempo, esconde as relações de dominação, ela reproduz a ideologia do capital e, ao mesmo tempo, oferece condições de emancipação humana. Ao passo em que nela a disputa de interesses se manifesta de forma mais ou menos contraditória, ela também manifesta e reproduz as relações sociais, políticas, econômicas e culturais. Portanto, a escola é o fruto destas múltiplas determinações.

É aí que se tem que qualquer projeto de educação passa necessariamente a representar um projeto social, movido por uma necessária intencionalidade. Faz-se, portanto, mister dizer que a escola não é neutra. Ainda que não se pretenda nela assumir uma ou outra postura política (entendendo o conceito de política não como representações partidárias, mas como uma ação movida por uma reflexão que pressupõe essa intencionalidade ) essa pseudo neutralidade traz consigo uma opção: conservar e reproduzir. É dentro destas contradições que se analisa o papel do currículo. Etimologicamente, currículo vem do latim curriculum, que significa “pista de corrida”.

No âmbito das apologias da sociedade sob o capitalismo, isto pode estar ligado ao conteúdo profissional que se apresenta na seleção de emprego a fim de competir – correr em busca de – no mercado de trabalho. Embora com outro significado, este conceito também expressa o que o currículo significa no âmbito das contradições do espaço escolar. O currículo da escola é a seleção intencional de uma porção de cultura. Cultura por sua vez, refere-se a toda a produção humana que se constrói a partir das interrelações do ser humano com a natureza, com o outro e consigo mesmo.

Esta ação essencialmente humana e intencional é realizada a partir do trabalho, através do qual o homem se humaniza e humaniza a própria a natureza. Por cultura entende-se, então, tudo o que os grupos sociais produzem para representar o seu jeito de viver, de entender e de “sonhar” o mundo. O currículo é portanto histórico, resultado de um conjunto de forças sociais, políticas e pedagógicas que expressam e organizam os saberes que circunstanciam as práticas escolares na formação dos sujeitos que, por sua vez, são também históricos e sociais.

Nesta perspectiva, o currículo deve oferecer não somente vias para compreender tanto os saberes nele inseridos, como também, os movimentos contraditórios pelos quais a sociedade vem enfrentando e de que forma os sujeitos se inserem neles. Neste sentido, à escola cabe erigir seu papel fundamental na transmissão, apropriação e socialização dos saberes culturais, numa base teleológica (intencional) que pressuponha uma práxis transformadora: caminho (pista de corrida) este a ser percorrido por todos na escola.

A fim de fazer um recorte histórico de explicitação de um dado “conceito” de currículo, podemos destacar o conceito trazido pelo “Currículo Básico da Escola Pública do Estado do Paraná”. O currículo Básico de 90 foi organizado à luz dos referenciais teóricos de Dermeval Saviani, considerado o “pai” da Pedagogia Histórico-Crítica. A intenção desta pedagogia e de outras de cunho progressista6 era superar e contrastar o espírito classista e dominante da sociedade sob o modo de produção capitalista, que trouxe no seu bojo as inspirações liberais e tecnicistas da ditadura.

Segundo Saviani (1991), era necessário democratizar o saber universal apropriado pela classe mais economicamente favorecida. A pedagogia dos anos 80 era considerada revolucionária no sentido de que a educação, uma vez socializando este saber e recuperando sua dimensão política, poderia ser um das vias para uma transformação social. Saviani defendia o retorno dos saberes clássicos bem como do clássico papel da escola na transmissão-assimilação do saber sistematizado.

Segundo Saviani, a escola existe “para propiciar a aquisição dos instrumentos que possibilitam o acesso ao saber elaborado, bem como o próprio acesso aos rudimentos desse saber “ (id., p. 23). Ao recolocar o papel do saber clássico7 na escola, Saviani também buscava recolocar o papel da própria escola e de sua especificidade e, neste sentido, também o papel do currículo. Segundo ele, quando a escola recupera o principal ela se diferencia do que é secundário; o principal é o compromisso com o saber, o secundário são todos os eventos, comemorações e temas que perpassam o currículo responsabilizando a escola por problemas pontuais que deslocam o papel do conteúdo e, portanto, o próprio papel da escola.

É com o compromisso em recolocar a natureza e especificidade da educação8 que Saviani destaca o papel do currículo como o “conjunto das atividades nucleares da escola”9 (id. 1984). Portanto, para Saviani, currículo tem uma dimensão clara – fazer uma seleção intencional dos conteúdos e da especificidade da escola a fim de promover a socialização do saber e o compromisso com a elevação cultural das massas. Assim sendo, muito mais que o conjunto das atividades nucleares da escola, o currículo é a própria expressão das intenções dela; muito mais que um projeto de escola, essas intenções refletem ou deveriam refletir um projeto de sociedade.

Neste sentido, ele expressa um caminho pelo qual, teoricamente, todos deveriam percorrer rumo a este projeto social. Tanto na dimensão transformadora como conservadora, o currículo escolar tem estado no foco das políticas educacionais, expressando assim a defesa por concepções pedagógicas, ideologias ou visões de mundo diferentes. Segundo Silva (2002), a visão de currículo numa perspectiva tecnicista e burocrática tinha intenções absolutamente dominantes que colocavam tanto nos métodos como nos objetivos a ideia de controle social.

Haja vista relembrar as teorias mais tradicionais de Bobbit e Torndike que traduziam no controle dos resultados e das respostas dos alunos os mesmos objetivos dos processos de fábrica. Isto significa que tanto no âmbito da gestão como do currículo, a escola reproduziria os pressupostos fabris: produtividade, eficiência, eficácia e, por fim, controle de resultados. Segundo Silva (2002), o movimento de reconceptualização do currículo pretende superar o caráter de ordem, de racionalidade e de eficiência do currículo burocratizante.

Nessa vertente, o currículo passa a ser entendido a partir do olhar da Sociologia da Educação. O movimento de reconceptualização, segundo os autores, passa pelos elementos de questionamento e problematização das relações de poder; um movimento que questiona e descentra o sujeito soberano, autônomo, racional e unitário. A linguagem, o discurso e o texto ganham uma importância central na problematização das relações de poder.

Este exercício de questionamento pressupõe, para Silva (2002), a superação das grandes metanarrativas e acena para o que ele chama de “contestação pós-moderna.” Currículo, por esta via, passa a ser entendido como forma de contestação de poder. Para efeitos de análise, ganham espaço privilegiado as categorias: cultura, poder, educação e ideologia.

A cultura é vista menos como uma coisa e mais como um campo e terreno de luta […] a cultura é o terreno em que se enfrentam diferentes e conflitantes concepções de vida social, é aquilo pelo qual se luta e não aquilo que recebemos. [..] O currículo não é o veículo de algo a ser transmitido e passivamente absorvido mas o terreno em que ativamente se criará e produzirá cultura [ …] é um terreno de produção e de política cultural (Silva, 2002, p.27-28).

Tomás Tadeu da Silva (2002) ao considerar currículo como “construção de identidade”10 coloca essa categoria em duas dimensões: currículo numa abordagem ontológica (o “ser” do currículo) e numa abordagem histórica ( teorias que explicam como tem sido definido).

Em outras palavras é possível também definir que essas duas abordagens representam respectivamente duas dimensões diferentes: de um lado uma perspectiva mais objetiva (qual é o caminho que se quer percorrer) e de outro lado uma dimensão mais subjetiva (nós nos construímos enquanto construímos o caminho). Esta discussão entre “o que é currículo” e entre “como ele vem sendo definido” é tratada por Tomás Tadeu da Silva, a partir da noção de discurso. Silva (2002) discorda da ideia de se definir exatamente o currículo.

Destaca que não há uma definição e sim diferentes teorias que discorrem sobre o que currículo representa. Portanto, não caberia, segundo ele, definir currículo e sim “mostrar que aquilo que currículo é depende precisamente da forma como ele é definido pelos diferentes autores e teorias” (2002, p. 14).

Nesta pista de corrida, segundo Silva, nós nos tornamos o que somos, ou seja, construímos nossa identidade. Currículo, tem para ele, uma dimensão absolutamente subjetiva; não uma dimensão ontológica, mas histórica. Seria possível concluir, segundo o autor, que, ainda que ele considere que sejamos seres sociais, currículo é sobretudo um projeto individual – uma construção da identidade.

Ao (não) conceituar currículo, Silva (2002, p.11-12) destaca o papel do discurso em detrimento da teoria. Segundo ele, o discurso produz seu próprio objeto, enquanto que a teoria descreve um objeto que já tem uma própria existência:

[…] a existência do objeto é inseparável da trama linguística que supostamente o descreve.[…] um discurso sobre currículo não se restringe a representar uma coisa que seria o currículo. […] Aquilo que numa outra concepção seria uma teoria, não se restringe a representar uma coisa que seria o “currículo“ que existiria antes desse discurso e que está ali apenas a espera de ser descoberto e descrito. Um discurso sobre o currículo, mesmo que pretenda apenas descrevê-lo “tal como ele realmente é”, o que efetivamente faz é produzir uma noção particular de currículo. A suposta descrição é, efetivamente uma criação.

Apoiado numa concepção pós-estruturalista, Silva relativiza a noção de currículo aproximando-a de uma dimensão subjetivista e pós-moderna. Desta forma, corre o risco de relativizar o caminho que se percorre e a própria linha de chegada. É possível concluir, portanto, que essa concepção relativiza também o próprio projeto de sociedade pelo qual a escola se inspira ao construir seu currículo.

Por pretender superar a dimensão racionalizante, Silva chama essa não “teoria” de concepção crítica de currículo. Quando currículo expressa a centralidade das políticas educacionais, ele está ao mesmo tempo expressando as intenções sociais, políticas, ideológicas e até econômicas desta “pista de corrida” e do caminho que se percorre nela.

Assim, currículo expressa as tensões e as contradições entre o caminho, a intenção deste caminho e o ponto de chegada dele. Caberia perguntar: que projeto de sociedade é este e qual é o caminho que esta “pista de corrida” encerra para um projeto que é, sobretudo, social e coletivo? Em síntese, o currículo é uma seleção sim de conteúdos, de concepções, de intenções que devem ser democratizados para toda a população, uma vez que são requisitos mínimos para a participação consciente em uma sociedade cada vez mais excludente, seletiva e contraditória.

Abre-se assim um espaço fundamental para a escola no que diz respeito ao seu Projeto Político[1]Pedagógico, que contemple os interesses da maioria da população através de novas formas de seleção, organização e tratamento metodológico dos conteúdos, “de maneira a oportunizar relações verdadeiramente significativas entre o aluno e o conhecimento, como condição para a sua participação efetiva no trabalho e na sociedade, de modo a ser protagonista da construção de uma nova ordem social” (Kuenzer, 2000, p. 67).

Essa dimensão reafirma o caráter político do currículo, que “[…] é o resultado de um projeto intencional de formação humana orientado para uma utopia, ao redor do qual se articulam todos os esforços da comunidade escolar”. Ele se inscreve no “âmbito das lutas entre distintas concepções de homem e de mundo, e, em decorrência, no âmbito das lutas pela construção de diferentes possibilidades históricas” (id. p. 68).

Por isso mesmo não há receitas além de grandes linhas gerais, cada escola desenvolvendo o seu processo segundo as condições concretas que estão dadas, e promovendo o avanço possível em cada momento. É bom lembrar que essas definições deverão ser antecedidas de um amplo levantamento das características dos alunos atendidos pela escola, contemplando suas necessidades e perspectivas de futuro.

”O primeiro critério de seleção de conteúdos será dado pela opção política que a escola fizer e pelas escolhas com relação às diferentes formas de organização dos componentes curriculares […]” (id. p. 69). “Há, pois, que buscar na sociedade contemporânea os conteúdos sobre os quais se constroem os modos de produzir e de organizar a vida individual e coletiva, sem deixar de tomá-los na sua perspectiva histórica” (id, p. 70).

Ainda de acordo com Kuenzer (2002, p. 71-72) a seleção e organização dos conteúdos deve pressupor a seleção de alguns conteúdos organizados de modo a promover:

articulação entre conhecimentos básicos e específicos a partir do mundo do trabalho, contemplando os conteúdos das ciências, das tecnologia e das linguagens; articulação entre conhecimento para o mundo do trabalho e para o mundo das relações sociais, contemplando os conteúdos demandados pela produção e pelo exercício da cidadania, que se situam nos terrenos da economia, da ética, da sociologia, da história, e assim por diante; articulação entre os conhecimentos do trabalho e das formas de organização e gestão do trabalho; articulação dos diferentes atores na construção da proposta: dirigentes, especialistas, técnicos, alunos, setores organizados da sociedade civil, etc.

Currículo, contudo, não pressupõe apenas a seleção dos conteúdos, mas também o método de apropriação dos mesmos. O conhecimento que dá conta da concepção de educação que pressuponha a compreensão do mundo em sua totalidade e em suas contradições, somente será aquele que for o produto do movimento histórico e social produzido e apropriado na totalidade, entendendo-a como a expressão dos condicionantes políticos, sociais, econômicos, culturais e históricos.

O ponto de partida para sua apreensão é sempre uma representação empírica, caótica e imediata da realidade – ainda difusa e nebulosa, não sistematizada da realidade (sincrética). Este pode ser o conhecimento empírico, popular ou de senso comum, mas que em seu movimento de problematização, instrumentalização e sistematização pretende ter como ponto de chegada as abstratas formulações conceituais, agora como produtos da totalidade ricamente articulada e compreendida, “mas também como prenúncio de novas realidades, apenas intuídas, que levam o presente a novas buscas e formulações a partir da dinâmica histórica que articule o já conhecido ao presente e anuncie o futuro” (id. p.77).

Segundo Kuenzer, uma concepção metodológica que tenha como pressuposto o movimento do conhecimento e da realidade numa perspectiva transformadora e não reprodutora pode ser sistematizada da seguinte forma:

  • o ponto de partida é sincrético, pouco elaborado, senso comum; o ponto de chegada é uma totalidade concreta, em que o pensamento re-capta e compreende o conteúdo inicialmente separado e isolado do todo; posto que sempre sínteses provisória, essa totalidade parcial será novo ponto de partida para outros conhecimentos;

  • os significados vão sendo construídos através do deslocamento incessante do pensamento das primeiras e precárias abstrações que constituem o senso comum para o conhecimento elaborado através da práxis, que resulta não só da articulação entre teoria e prática, entre sujeito e objeto, mas também entre o indivíduo e a sociedade em um dado momento histórico;

  • o percurso vai do ponto de partida ao ponto de chegada, possuindo uma dupla determinação, finita ou infinita; pode-se buscar o caminho mais curto ou se perder, marchar em linha reta, seguir uma espiral ou manter-se no labirinto; ou seja, construir o caminho metodológico é parte fundamental do processo de elaboração do conhecimento (id., p. 77).

Isso implica que essa concepção dialética de educação, compreende o processo de produção do conhecimento como resultante da relação entre o homem e as relações sociais em seu conjunto, através da atividade humana – ou do trabalho como práxis humana e como práxis produtiva. Descolado do movimento de sua historicidade, o conhecimento dificilmente terá significado para um estudante que recebeu a tarefa de incorporá-lo a partir de sua expressão mais formalizada e estática.

Isso aponta outro princípio educativo: é preciso privilegiar a relação entre o que precisa ser conhecido e o caminho que precisa ser trilhado para conhecer, ou seja, entre conteúdo e método, na perspectiva da construção da autonomia intelectual e ética. Se o homem só conhece aquilo que é objeto de sua atividade, e conhece porque atua praticamente, o conhecimento tem de adquirir corpo na própria realidade sob a forma de atividade prática, e transformá-la.

  • O conhecimento é uma construção coletiva e histórica, que tem sua base no trabalho humano em sua dimensão produtiva e criativa, por isso é socialmente determinado e apropriado, sendo importante a intervenção ativa do aluno no processo de aquisição/produção do conhecimento;

  • o conhecimento científico não é neutro, pronto, acabado. É determinado pelas visões de mundo da sociedade, as quais ele determina, pressupondo a problematização como ponto de partida do trabalho pedagógico em sala de aula;

  • a organização do currículo por áreas de conhecimento é uma maneira de recortar a realidade. Trata-se de uma perspectiva de análise e não uma proposta de fragmentação do real, podendo, por isso, possibilitar práticas pedagógicas transdisciplinares;

  • o conhecimento científico não é ensinado tal como é discutido e formulado na academia. Na escola ele convive com outros tipos de conhecimento. Assim, a função do professor em sala de aula é a de vivenciar com seus alunos a transposição didática do saber científico em saber escolar, possibilitando a construção de novos saberes;

  • para que o conhecimento seja significativo para os sujeitos da relação didática, a transposição do saber científico e saber escolar pressupõe que se tome a experiência do aluno como referência para o processo ensino/aprendizagem;

  • a ressignificação dos conteúdos pelos sujeitos da relação didática, processo pelo qual o conhecimento torna-se individual e coletivamente significativo, implica articular os conteúdos com a vivência cotidiana e com os conhecimentos prévios dos alunos (Kuenzer, 2000, p. 190).

Em síntese, o Projeto Político-Pedagógico da escola é a expressão da intencionalidade do conjunto da comunidade escolar a respeito da sociedade que se possa almejar, aquela que não reproduza as condições históricas de dominação, alienação e expropriação da condição humana. Uma vez que a escola expressa essas contradições, o Projeto Político-Pedagógico da escola deve partir do seu diagnóstico mais pontual (da comunidade escolar, das interfaces entre ensino e aprendizagem, entre professor e aluno) – o diagnóstico da própria cultura escolar, mas que expressa um diagnóstico mais global – o da sociedade em suas determinações.

O que se vislumbra a partir daí é pensar coletivamente na forma pela qual a escola se organizará para avançar rumo a seu projeto educativo. A Proposta Pedagógica Curricular, por sua vez, é a expressão de uma determinada concepção de educação e de sociedade, pensada filosófica, histórica e culturalmente no Projeto Político-Pedagógico. Ela é construída pelos professores das disciplinas e mediada pela equipe pedagógica, os quais lançam mão dos fundamentos curriculares historicamente produzidos (Currículo Básico, Diretrizes Curriculares Estaduais) para proceder a esta seleção de conteúdos e método com sua respectiva intencionalidade.

O Plano de Trabalho Docente é a expressão da Proposta Pedagógica Curricular, a qual, por sua vez, expressa o Projeto Político-Pedagógico. O plano é a representação escrita do planejamento do professor. Neste sentido, ele contempla o recorte do conteúdo selecionado para um dado período. Tal conteúdo traz consigo essa intencionalidade traduzida a partir dos critérios de avaliação. Para que isto se efetive, o professor deve ter clareza do que o aluno deve aprender (conteúdos), por que aprender tal conteúdo (intencionalidade–objetivos), como trabalhá-lo em sala (encaminhamentos metodológicos), e como serão avaliados (critérios e instrumentos de avaliação).

A seleção dos conteúdos, retomando, não é aleatória. Ela foi feita exatamente com base em alguma intenção, a qual é a expressão do Projeto Político-Pedagógico, construído coletivamente pela comunidade escolar. Neste momento o projeto de sociedade se efetiva no currículo e para tal deve sair do papel e passar para a prática docente junto aos discentes. Ou seja, a partir da proposta pedagógica, a qual reúne a concepção das disciplinas em torno da concepção de educação sistematizada no Projeto Político Pedagógico, o professor planeja suas aulas e organiza seu Plano de Trabalho Docente.

É o currículo em ação. Retomando a concepção de que o pedagogo é o profissional que atua em várias instâncias da prática educativa, direta ou indiretamente vinculadas à organização e aos processos de aquisição de saberes e modos de ação, com base em objetivos de formação humana definidos coletivamente no Projeto Político-Pedagógico, esse passa a ser compreendido como mediador e o articulador deste projeto na escola, que se consolida, principalmente através do Plano de Trabalho Docente e do trabalho efetivo do professor em sala de aula.

Tendo-se como pressuposto a clareza quanto às questões já postas, cabe a explicitação do que se constitui como trabalho do pedagogo, especificamente junto ao professor de cada disciplina, na condução do processo de transmissão-assimilação dos conteúdos. Assim, como a escola é a mediadora entre o conhecimento e a comunidade, o professor é o mediador entre o conhecimento e o aluno, sendo o pedagogo o mediador entre o método, as formas de condução do conhecimento e a prática docente. É do pedagogo a responsabilidade de transformar o conhecimento difuso em sistematizado e assimilável, ou saber escolar (Saviani, 1985).

Cabe ao pedagogo dar suporte ao trabalho docente, utilizando-se do conhecimento, próprio da sua função, dos componentes técnico-práticos, psicológicos, sociopolíticos, decorrentes das ciências auxiliares da educação, no ato educativo (Libâneo,1990), levando o aluno a apropriar-se da matéria (conteúdo), objeto do processo de ensino e aprendizagem.

Entendendo o Plano de Trabalho Docente como expressão do currículo em sala de aula e que este, na sua natureza não é neutro, pois os conteúdos “selecionados” também não são neutros, uma vez que expressam e legitimam uma intencionalidade e estão voltados para as finalidades da educação e para quem se destina, é papel do pedagogo articular os conteúdos à concepção de homem, sociedade e educação pensados coletivamente no Projeto Político-Pedagógico da escola e, a partir daí, direcionar explicitamente a prática educativa. Sob esta perspectiva, o Plano de Trabalho Docente é político e pedagógico, pois permite a dimensão transformadora do conteúdo.

O Plano de Trabalho Docente é um documento que antecipa a ação do professor, organizando o processo de ensino e aprendizagem. Nele se pensa o que fazer, como fazer, quando fazer, com que fazer e para quem fazer, e é papel do pedagogo fazer a articulação entre a teoria e a metodologia, dentro das condições concretas de ensino e aprendizagem, uma vez que, como responsável pela organização do trabalho pedagógico da escola como um todo, deve conhecer as possibilidades e as relações dos diversos contextos que a constituem, sendo-lhe possível prever e prover, de forma sistemática, os recursos e a distribuição do tempo e espaço escolares, para que as atividades planejadas sejam realizadas, além de analisá-las quanto à sua efetividade para promoção da aprendizagem.

Com esse enfoque, o Edital nº10/2007 do concurso para pedagogos, especifica, dentre outras, as funções atribuídas ao pedagogo na articulação do Plano de Trabalho Docente, sendo elas:

  • Apresentar propostas, alternativas, sugestões que promovam o desenvolvimento e o aprimoramento do trabalho pedagógico escolar, conforme Projeto Político-Pedagógico, Proposta Pedagógica Curricular, Plano de Ação e políticas educacionais da SEED;
  • orientar o processo de elaboração dos Planos de Trabalho Docente junto ao coletivo de professores na escola;
  • organizar a hora-atividade do coletivo de professores da escola, de maneira a garantir que esse espaço/tempo seja usado em função do processo pedagógico desenvolvido em sala de aula.

Sendo assim, cabe ao pedagogo em sua prática pedagógica junto à equipe docente: mediar a concepção posta no Projeto Político-Pedagógico e na Proposta Pedagógica Curricular, garantindo a sua intencionalidade no Plano de Trabalho Docente. A educação, numa concepção transformadora, pressupõe tomar o aluno na sua totalidade, não em um momento reduzido como “aluno”, e isso implica em entendê-lo dentro de uma dinâmica social, onde as ações são determinadas.

Essa compreensão remete à ideia de atividade humana como práxis que, segundo Marx (apud Martins, 2004, p. 58), “[…] encerra uma tríplice orientação: o que fazer, para que fazer e como fazer, efetivando-se apenas em condições sociais coletivas.” É dessa ideia de práxis, sempre intencional, que a ação do pedagogo junto ao professor, permite realizar o trabalho educativo, descrito por Saviani como “[…] ato de produzir, direta e intencionalmente, em cada indivíduo singular, a humanidade que é produzida histórica e coletivamente pelo conjunto dos homens”, já que “[…] o indivíduo da espécie humana não nasce homem; ele se torna homem, se forma homem […] precisa ser educado.” (Saviani apud Martins, 2004, p. 46).

Assista aos Vídeos Abaixo:

   

   

REFERÊNCIAS

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Título : Organização do Trabalho Pedagógico

Fonte: Organização do trabalho pedagógico / Secretaria de Estado da Educação. Superintendência da Educação. Coordenação de Gestão Escolar. – Curitiba : SEED – Pr., 2010.