O Século XIX: O Século da Pedagogia

O século XIX, de acordo com Francisco Cambi, é o século da pedagogia, momento emblemático da luta de classes (entre burguesia e proletariado), que envolveu sociedade, cultura, economia e política, conforme Figura. Esta situação acarretou uma radicalização das ideias pedagógicas e educativas, consolidando-as como ferramentas de controle social e do “projeto político e da própria gestão do poder (social e político)” (CAMBI, 1999, p. 407).

O Século XIX: O Século da Pedagogia

Saiba mais: Burguesia – a burguesia é a classe social que está do lado oposto do proletariado, é a classe social, do regime capitalista, que abrange todos os grupos ou indivíduos cujos interesses se identificam com os dos possuidores de capital, ou seja, dos comerciantes, industriais, banqueiros, os proprietários de terras, os possuidores de riqueza e dos meios de produção. Proletariado – é a classe dos proletários, é a classe dos operários, constituída de indivíduos que se caracterizam pela sua condição permanente de assalariados e pelos seus modos de vida e atitudes decorrentes de tal situação.

Com o surgimento da revolução industrial e o desenvolvimento econômico e social, teve início uma mobilização social, vindo a delinear o perfil da burguesia. Essas transições ocorridas “numa sociedade economicamente e politicamente turbulenta, estão ideologicamente impregnadas também na sua cultura. Nessa conjuntura, o ato de educar se torna um mecanismo de controle (para a burguesia) e de emancipação social (para o povo)” (CAMBI, 1999, p.492).

Saiba mais: A Revolução industrial foi um conjunto de mudanças que aconteceram na Europa nos séculos XVIII e XIX. A principal particularidade dessa revolução foi a substituição do trabalho artesanal pelo assalariado e com o uso das máquinas.

No cenário da educação, esse atrito entre classes deu vazão ao surgimento de pedagogias diferenciadas, com modelos e orientações diversas sempre altamente imbuídas em todas as vertentes e etapas da pedagogia do século XIX (SAVIANI, 1997). É dentro desse contexto que a ideia de liberdade defendida por pensadores como Pestalozzi, Fichte e Fröbel (Cambi, 1999), conforme Quadro 1, se torna o indicador sociopolítico e, por conseguinte, ideológico da educação.

O Século XIX: O Século da Pedagogia

O Século XIX: O Século da Pedagogia

Em conformidade com Manacorda (2001) é neste contexto delineado por obstáculos políticos e sociais que se desenvolve mudanças no pensar didático e pedagógico entre iniciativas da burguesia (conservadora) e os anseios do proletariado (que buscavam mudanças). O autor ainda evidencia que este duelo influencia todas as esferas e níveis da educação, desde a instrução até as escolas infantis, elementares e secundárias. Essa constatação entrelaça ainda o problema referente aos conteúdos e ao método, que estão condicionados ao progresso das ciências. Assim, na evolução histórica do período, estão implícitas mudanças oriundas das experiências vividas durante o mesmo na sua aplicabilidade. Além disso, Andrade et al. (2012) nos diz que:

O acesso à instrução, a atribuição da responsabilidade do estado e a separação da mesma em relação à igreja se configuram como aspectos importantes no desenvolvimento educativo dos Oitocentos. Essas tensões aludem a relação entre educação e sociedade, indicando que o debate pedagógico estava intimamente ligado ao conflito sociopolítico, e ambos resultados de contradições e causadores de outras ainda por vir. (ANDRADE et al., 2012, p. 178)

De acordo com Cambi (1999, p. 410), “entre positivismo e socialismo, a ideologização da pedagogia torna-se ainda mais forte e, sobretudo, mais explícita”. Ainda segundo ele a pedagogia é herdeira da sociologia, assumindo a tendência de socializar o homem de acordo com modelos funcionais para uma determinada sociedade. Em contrapartida, no segundo caso a pedagogia é desnudada no seu teor ideológico da liberdade. A tônica dessas evidências está inserida, portanto, nos processos de “ideologização” expostos por Cambi (1999), que também aponta que tal situação é oriunda da posição central da educação no reordenamento social dos grupos e classes sociais.

Conforme o ponto de vista de Cambi (1999), vê-se que essa questão da ideologia constitui um aspecto importante e central da pedagogia do século XIX. A rigor, o autor declara que “estamos diante de uma pedagogia bastante crítica em relação às ideologias e às estruturas da sociedade moderna” (1999, p. 412). Outro ponto essencial na afirmação da pedagogia nos Oitocentos é sua reformulação enquanto saber científico e a reorganização técnica da escola como instituição.

Em vista disso, Cambi (1999, p. 414) resume o século XIX como “bastante rico em modelos formativos, em teorizações pedagógicas, em compromisso educativo e reformismo escolar, em vista justamente de um crescimento social a realizar-se da maneira menos conflituosa possível e da forma mais geral”. Mais ainda, é característica resistente da pedagogia no século XIX, o embate teórico e a contribuição de pensadores como Hegel – historicista, e Herbart – realista, conforme Quadro 2, avessos ao romantismo de Pestalozzi, Schiller e Fröbel.

Saiba mais: Historicismo, também conhecido como Historismo, afirma que há uma sucessão orgânica da evolução, e que as condições e peculiaridades locais influenciam os resultados de uma forma decisiva. Historicismo: http://www.portalsaofrancisco.com.br/historiageral/historicismo

O Século XIX: O Século da Pedagogia

O Século XIX: O Século da Pedagogia

A pluralidade de ideias e teorias caracteriza o pensamento pedagógico, em várias partes do mundo, vinculado às particularidades do contexto a qual pertence. Na Inglaterra, França, Alemanha, Itália, conforme Figura, a atividade pedagógica educativa foi posta em prática, expondo em diversos níveis as relações entre educação, sociedade e política.

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Cambi (1999) nos diz que os Oitocentos foram marcados com a consolidação da sociedade industrial na Europa. Conforme apontamos acima, os diversos países europeus vivenciaram transições e alternâncias em padrões particulares para cada um. Embora com intensidades diferentes, a Europa atravessou “um processo de redefinição dos objetivos e dos instrumentos da pedagogia” (CAMBI, 1999, p. 465). A propagação das tendências psicológicas, sociológicas e científicas conduziu por diversas vezes o enfoque dado à atividade educativa e pedagógica, logo, são concedidos novos papéis de atuação social e político, assumindo a finalidade de formação do cidadão embasada em preceitos cientificistas (MONROE, 1979).

A relação entre educação e a industrialização da sociedade se dá no contraste entre o socialismo e o positivismo. Conforme já mencionamos anteriormente, a contraposição entre burguesia e proletariado esboça a dicotomia entre o positivismo e o socialismo, representado na Figura. Assim para Cambi (1999), esses dois modelos representam o conflito entre classes que está no cerne da sociedade industrial. Logo, a pedagogia veste-se das interpretações destas duas correntes, mudando seu enfoque de acordo com as referências de cada uma.

Termo do glossário: dicotomia é a divisão de um elemento em duas partes, em geral contrárias, como a noite e o dia, o bem e o mal, o preto e o branco, o céu e o inferno etc.

O Século XIX: O Século da Pedagogia

Iskandar e Leal (2002) apontam que as mudanças nos questionamentos educativos e pedagógicos fizeram com que o positivismo e o socialismo mudassem suas configurações de abordagens. Ainda segundo os autores, a discussão e o debate da pesquisa pedagógica impelem em um nível variado e diverso, onde seus modelos explicativos, métodos e objetivos estão ordenados de acordo com o ambiente socioeconômico e histórico, conforme Figura.

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A propagação do positivismo pela Europa ungiu correntes heterogêneas na Inglaterra, Itália e França, vindo a funcionar como incubadora de abordagens e a criar novas perspectivas, difundindo o positivismo pela Europa (SANTOS, 2012). Logo, percebe-se que a evolução das teorias e práticas educativas e pedagógicas estavam em sintonia com as características de cada país, porém, resguardaram-se semelhança que convergiam para instituí-las enquanto ciência.

Saiba mais: mistura é um sistema formado por duas ou mais substâncias puras, chamadas componentes. As misturas podem ser classificadas em homogêneas e heterogêneas. A diferença entre elas é que a mistura homogênea é uma solução que apresenta uma única fase enquanto a heterogênea pode apresentar duas ou mais fases.

A evidência e a participação desses países europeus dentro da conjuntura internacional no século XIX, muito se deve por eles terem se destacado nesse período na parte pedagógica e educativa. Colocada à prova pela aplicação de suas ideias e procedimentos, a pedagogia e a educação foram modelando-se de forma a estabelecer a importância da instrução;

  • Delimitar os parâmetros que regem os conteúdos escolares;
  • Observar as dinâmicas sociais de modo a alinhar seus objetivos e adequar as estruturas e os programas escolares. Ao longo do século XIX, para Saviani (2007) a pedagogia moderna modela-se e começa a atuar junto com a organização de instituições voltadas para a educação, assim, a estruturação de um sistema e sua administração da instituição-escola sofre uma reavaliação da sua prática didática.

Eis que, esse processo de desenvolvimento vem a assemelhar-se com à evolução das abordagens, teorias e práticas educativas. Cambi (1999, p. 492) aponta que houve “um crescimento social da escola, um desenvolvimento na sua organização, um papel político mais forte.” Outro aspecto relevante da pedagogia no século XIX é o surgimento da pedagogia científica e da experimental. Para Cambi (1999, p. 498) “esse acontecimento é enriquecedor por promoverem uma cisma com a filosofia e a política, ao mesmo tempo em que as relacionam com a fisiologia, antropologia e psicologia”. Tal prática proporciona à pedagogia a renovação dos seus conteúdos e métodos, fazendo uso do paradigma científico, indutivo e experimental, conforme o Quadro.

O Século XIX: O Século da Pedagogia

Por fim, podemos por meio do estudo sobre o século XIX, discorrer que ele foi norteado por uma série de tensões e crises. Conforme foi dito anteriormente, as convulsões implicadas pelos atritos entre burguesia e proletariado atingem seu clímax e colaboram para o surgimento das bipolarizações (esquerda, direita, internacionalismo e colonialismo, e etc.). Também neste cenário se dá uma série de renovações no âmbito da cultura, influenciando em um distanciamento das correntes defendidas ao longo dos Oitocentos: Idealismo, positivismo, entre outros.

Saiba mais: ao idealismo da primeira metade do século XIX se segue o positivismo, que ocupa, mais ou menos, a segunda metade do mesmo século, espalhado em todo o mundo civilizado. O positivismo representa uma reação contra o apriorismo, o formalismo, o idealismo, exigindo maior respeito para a experiência e os dados positivos.

A pedagogia e a educação se encontram envolvidas nessa agitação cultural, resultado de séculos de indisposições, atritos e mudanças nos diferentes estratos da sociedade. Todo esse contexto em ebulição é condição determinante para o surgimento e a constante renovação das correntes educativas e pedagógicas.

FONTE:

Teorias da educação [recurso eletrônico] / Cíntia Moralles Camillo, Liziany Müller Medeiros. – Santa Maria, RS : UFSM, NTE, 2018.

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