Metafísica ausente

Metafísica ausenteÉ possível notar uma tensão na obra de Skinner quando buscamos por evidências de seu posicionamento ontológico sobre a natureza do comportamento. Há diversos fatores que contribuem para a manutenção dessa situação. Primeiramente, Skinner não estava interessado em problemas metafísicos e mais de uma vez apresentou comentários ressaltando esse ponto (Skinner, 1931/1961c, 1953/1965, 1956/1961j, 1963a, 1969b, 1987b). Em segundo lugar, parece existir certa ambiguidade na obra do autor no que tange à importância da substância no estudo do comportamento.

Por um lado, o autor faz questão de salientar que o comportamento é constituído por substância física (Skinner, 1935/1961e, 1945/1961g, 1953/1965, 1954, 1956/1961j, 1966c, 1967, 1974, 1975, 1979), ao passo que, por outro lado, nega sua relevância no estudo do comportamento (Skinner, 1938/1966a, 1953/1965, 1956/1961j, 1963a, 1969b, 1979, 1980/1998, 1987b). Como poderíamos aliviar essa tensão? Só uma análise cuidadosa das obras em que Skinner expõe suas ideias pertinentes ao tema poderá indicar o caminho. Comecemos, então, com a “metafísica ausente” do behaviorismo radical. Desde o início de seus escritos, Skinner já se mostrava desgostoso com a metafísica:

Nós temos procedido, evidentemente, sobre uma hipótese desnecessária, a saber, a de que há […] o reflexo, coisa que existe independentemente das nossas observações, e da qual nossas observações se aproximam. Tal hipótese é totalmente gratuita, mas é notavelmente insistente. […] se por reflexo queremos dizer uma entidade hipotética que existe de modo independente das nossas observações, mas da qual se assume que nossas observações se aproximam, os problemas são acadêmicos e não precisam nos deter; se, por outro lado, definimos o reflexo como uma dada correlação observada ou como um tratamento estatístico das correlações observadas, então os problemas não têm sentido, pois ignoram o processo de análise implícito na definição. (Skinner, 1931/1961c, p.341)

É importante ressaltar que, no período em que o texto foi escrito, “reflexo” era um termo geral que abarcava qualquer relação comportamental, não se restringindo apenas à relação respondente (seção 2.3). Podemos supor, portanto, que a posição expressa nessa passagem de Skinner pode ser direcionada ao comportamento como um todo. Skinner (1931/1961c) apresenta duas formas de definir a natureza do reflexo. A primeira delas consiste na visão realista da ciência (Nagel, 1961), segundo a qual o fenômeno estudado existe independentemente da observação do cientista, cujo papel, por sua vez, seria o de aproximar‑se cada vez mais da verdadeira natureza do fenômeno através de procedimentos científicos.

As teorias resultantes seriam verdadeiras se a aproximação com a realidade fosse comprovada. Nesse sentido, as teorias científicas seriam quase substitutos formais verbais da realidade. Já a segunda forma de definição é bem próxima da visão instrumental da ciência (Nagel, 1961), segundo a qual as teorias serviriam como instrumentos para manipulação da realidade, mas que, nem por isso, necessariamente a refletiriam formalmente. De acordo com o ponto de vista instrumentalista, uma teoria científica não teria valor de verdade porque não haveria pretensões de compará‑la com a realidade independente de nossas observações.

No que concerne ao trecho de Skinner supracitado, o fato mais importante é que, a despeito de qual seja o ponto de vista acatado, a decisão não influirá na ciência do comportamento. O realismo é uma questão a ser analisada por metafísicos e não por cientistas do comportamento, e os últimos não devem esperar que os primeiros cheguem a alguma conclusão para continuarem com seus experimentos. Por outro lado, se se defende o instrumentalismo, então a própria questão sobre a natureza independente do reflexo perde seu sentido, já que desconsidera o caráter analítico que envolve a sua definição.

Dessa forma, é possível notar que Skinner não tinha interesse por essas questões: ele era acima de tudo um cientista do comportamento e não um realista ou instrumentalista. O desinteresse pela metafísica é especialmente recorrente quando Skinner discorre sobre a natureza substancial do mundo. Paradoxalmente, como veremos adiante, é justamente nesse âmbito que encontramos suas afirmações mais incisivas sobre a importância da substância para o behaviorismo radical:

Outro problema no controle por estímulos tem atraído mais atenção do que merece por causa de especulações metafísicas sobre o que está “realmente lá” no mundo de fora. O que acontece quando um organismo responde “como se” um estímulo ti‑ vesse outras propriedades? Esse comportamento parece indicar que o mundo “perceptual” – o mundo tal como o organismo o experiencia – é diferente do mundo real. Mas, na verdade, a diferença é entre respostas – entre respostas de dois organismos ou entre respostas de um organismo sob modos diferentes de estimulação a partir de um único estado de coisas (Skinner, 1953/1965, p.138, itálico adicionado). O argumento dualista sucede da seguinte forma. Nós não conhecemos o mundo tal como ele é, mas apenas como ele parece ser. Nós não podemos conhecer o mundo real porque ele está fora do nosso corpo, em grande parte à distância. Conhecemos apenas cópias que estão dentro dos nossos corpos. […] Se aceitamos a posição grega de que podemos conhecer apenas nossas sensações e percepções, [então] há apenas um mundo, e este é o mundo da mente. É muito simples parafrasear a alternativa behaviorista dizendo que há, de fato, apenas um mundo e que este é o mundo da matéria, pois o termo “matéria” não é mais útil. Seja qual for a substância da qual o mundo é feito, ele contém organismos (dos quais nós somos exemplos) que respondem a outras partes dele [do mundo] e, assim, “conhecem” em um sentido não muito distante de [entrar em] “contato”. Nas situações em que o dualista precisa considerar discrepâncias entre o mundo real e o mundo da experiência, e o idealista berkeliano entre experiências diferentes, o behaviorista investiga discrepâncias entre respostas diferentes. (Skinner, 1969b, p.247‑9, itálico adicionado)

Essas duas passagens tratam do mesmo assunto e em ambas Skinner é avesso à importância dada à substância. São as “especulações metafísicas” sobre como explicar a relação entre “mundo real” e “mundo da experiência”, bem como as discrepâncias que podem ocorrer no processo – quando, por exemplo, um sujeito experiência algo que não está no “mundo real”, mas é “como se estivesse no mundo real” – que estão em pauta.

Em outras palavras, Skinner está lidando com o problema da percepção (seção 3.3) e com o problema do conhecimento (seção 2.6). O autor (1969b) apresenta duas abordagens. Há o ponto de vista dualista, que leva esse nome por sustentar a existência de dois mundos: o “mundo real”, que é o mundo físico, e o “mundo da experiência”, que é o mundo da mente (subseção 1.1.1). Na verdade, Skinner (1953/1965, 1969b, 1974) relaciona o dualismo com a teoria representacionista da percepção, segundo a qual não seria o mundo real a ser percebido, mas sim cópias ou representações desse mundo construídas na mente do observador (seção 3.3).

Aos dualistas apresentam‑se dois problemas: como ocorre a relação entre representação (“mundo da experiência”) e objeto percebido (“mundo real”)?; e como explicar as discrepâncias entre representação e realidade? O argumento central do idealismo, por sua vez, é que existe apenas a mente, sendo o mundo real uma ilusão criada por ela. Dessa forma, haveria um monismo, mas um monismo mental. Não haveria representação da realidade, tal como no dualismo, mas unicamente a “realidade mental”.

Restaria somente responder como e por que existem discrepâncias entre percepções e sensações distintas dentro do mundo monista mental. Skinner (1969b) conclui que seria muito simples apresentar o behaviorismo radical como teoria materialista, pois o termo “matéria” perdeu sua importância. O que o autor quer dizer com isso? Primeiramente, é importante ressaltar que tanto o dualismo quanto o idealismo são teses sobre a natureza substancial do mundo. Para o primeiro há duas substâncias, a mental e a física, e para o segundo há apenas a substância mental.

Qual seria a terceira opção? Naturalmente, a única que falta é a de que existe apenas uma substância, a física. Todavia, Skinner segue este rumo em sua argumentação: é muito fácil dizer que o behaviorismo radical é monista fisicalista. O que justifica esse ato? Poderíamos sugerir que a posição de Skinner reflete seu desinteresse pela metafísica: para o behaviorismo radical não importa qual seja a natureza substancial do mundo. Mas essa interpretação não seria precisa o bastante. A chave para entender a posição de Skinner está na primeira citação: as discrepâncias encontradas no processo perceptivo devem ser explicadas a partir das contingências de reforço.

O mesmo “estado de coisas” (Skinner, 1953/1965, p.138) pode constituir estímulos funcionalmente diferentes. Um objeto físico com propriedades físicas específicas, por exemplo, pode servir de estímulo discriminativo ou até mesmo de estímulo eliciador para respostas visuais das mais diversas (seção 3.3). O que importa é a história de reforçamento responsável pelo repertório comportamental dos sujeitos. Nas palavras de Skinner (1974, p.79): “pessoas veem coisas diferentes quando estiverem expostas a diferentes contingências de reforço”. Se há discrepâncias entre como um sujeito S1 e um sujeito S2 respondem ao mesmo estado de coisas – que, nesse caso, constituiria dois estímulos diferentes, um para S1 e outro para S2 –, é só porque as classes comportamentais de S1 e de S2 devem ser funcionalmente diferentes.

Em suma, o que Skinner faz é ressaltar que as especulações metafísicas sobre a natureza substancial do mundo não são importantes, na medida em que as explicações estão nas contingências e não nos “estados de coisas” que as constituem. É exatamente nesse sentido que o termo “matéria” perdeu sua importância, pois a defesa do monismo fisicalista, por si só, não ajudaria nas explicações do comportamento. Há, porém, um ponto que deve ser ressaltado. O behaviorismo radical é veementemente contrário à teoria representacionista da percepção e do conhecimento.

Conhecimento não é contemplação, não é algo que um sujeito possui e estoca em sua mente para uso futuro. Conhecimento é comportamento (seção 2.6). A percepção, por sua vez, é apresentação e não representação. O observador não cria cópias mentais do mundo percebido. Ele responde aos estímulos na medida em que os percebe e, dessa forma, os conhece (seção 3.3). Sendo assim, mesmo sem especulações metafísicas, a teoria dualista não é posição cabível no behaviorismo radical. A defesa da existência de um “mundo mental” em adição à existência de um “mundo físico”, que além de tudo se relacionam entre si, traz consigo teses – como a da representação e do conhecimento – com as quais o behaviorismo radical é, em princípio, incompatível.

Nas palavras de Skinner (1988, p.213): “É a essência do behaviorismo argumentar que uma pessoa não internaliza o mundo ou faz cópias dele […] e que o comportamento que aparenta precisar de uma representação interna deve ser explicado de outra forma”. Portanto, é possível supor que, não importa qual seja a natureza substancial do mundo – física, mental ou qualquer outra –, esse mundo deve conter apenas uma delas. O dualismo substancial parece não ser posição compatível com as explicações behavioristas radicais do comportamento. Essa questão será abordada adiante. Em tempo, continuemos com outra passagem em que Skinner nega se importar com a natureza substancial do mundo:

Por mais de 2.500 anos filósofos e psicólogos têm discutido a natureza dessa substância [mental], mas para os propósitos atuais nós podemos aceitar a dissolução que apareceu na Punch2 em 1855: O que é matéria? – Never Mind. O que é mente? – No Matter. Mente ou matéria, era algo dentro da pessoa que determinava o que ela fazia. (Skinner, 1987b, p.780, itálico adicionado)

Nessa citação, Skinner reafirma seu desinteresse pela natureza substancial da mente. O que está em questão aqui, todavia, não é a teoria da percepção ou do conhecimento, mas sim o problema do agente iniciador do comportamento. Em linhas gerais, não importa se a mente é algo imaterial ou algo físico, pois as teorias mentalistas ainda explicam o comportamento em função de causas internas. No mesmo texto, Skinner (1987b, p.780) observa que o erro na psicologia é que “o comportamento é raramente considerado como um objeto de estudo em si mesmo, sendo antes considerado como mera expressão ou sintoma de acontecimentos mais importantes internos à pessoa que se comporta”.

Em outra passagem, o autor (1988, p.245) afirma que “a questão crucial no behaviorismo não era o dualismo; mas sim a origem”. O que Skinner quer dizer com isso? Como já vimos em outras partes deste livro (seções 2.3, 3.2 e 4.4), as explicações do comportamento devem ser buscadas na história filogenética e ontogenética do organismo. Elas não estão dentro do organismo. É evidente que um organismo que carrega consigo a história filogenética de sua espécie e que passou por uma história ontogenética singular é um organismo fisiologicamente modificado.

Mas a explicação do comportamento não está na estrutura que compõe o organismo, invariavelmente caracterizada como algo que está dentro dele, mas sim na própria história. Em síntese, não importa se o agente interno é “mental cartesiano” ou “mental cerebral”, pois as explicações estão na história filogenética e ontogenética do organismo – elas estão no comportamento enquanto processo. Prosseguindo com a análise das passagens em que Skinner diz não estar interessado na natureza substancial do mundo:

Não quero levantar a questão da suposta natureza dessas entidades internas. […] se há aqueles que acreditam que a psiquiatria preocupa‑se com um mundo para além do organismo psicobiológico ou biofísico, que a mente consciente e inconsciente não possuem extensão física, e que os processos mentais não afetam o mundo de acordo com as leis da física, então os argumentos seguintes devem ser tanto mais convincentes. A questão não é a da natureza desses eventos, mas sim a de sua utilidade e conveniência numa descrição científica. (Skinner, 1956/1961j, p.209‑ ‑10, itálico adicionado) O problema básico não é a natureza da substância da qual o mundo é feito, ou se o mundo é feito de uma ou duas substâncias, mas sim a dimensão das coisas estudadas pela psicologia e os métodos relevantes para elas. […] A objeção não é que essas coisas são mentais, mas que elas não oferecem explicação real e ficam no caminho de uma análise mais efetiva. (Skinner, 1963a, p.951, itálico adicionado)

Nessas passagens, Skinner apresenta críticas mais gerais. Não está mais se referindo a temas específicos, como a teoria da percepção, o problema do conhecimento ou as explicações internalistas do comportamento. Dessa vez há duas questões essenciais e inseparáveis: o behaviorismo radical enquanto filosofia da ciência e a efetividade da explicação comportamental. De certa forma, talvez não de maneira tão evidente, essas questões já estavam presentes nas asserções do autor supracitadas. Nesse contexto, a questão‑ ‑chave que se coloca é a seguinte: qual é o propósito da ciência do comportamento humano? Deixemos Skinner (1953/1965, p.23) responder:

Queremos saber por que os homens se comportam da maneira que se comportam. Qualquer condição ou evento que possa ter efeitos demonstráveis sobre o comportamento deve ser levado em conta. Pela descoberta e análise dessas causas nós podemos prever o comportamento; na medida em que podemos manipular o comportamento, nós podemos controlá‑lo.

Essencialmente, o objetivo da ciência do comportamento é manipular as variáveis relacionadas ao fenômeno estudado e, a partir dos dados obtidos nesse processo, criar condições para a previsão e para o controle do comportamento. As características da filosofia da ciência behaviorista radical já foram apresentadas em outra parte deste trabalho (seção 2.2). Entretanto, há um ponto que é de suma importância para entender o desdém pela metafísica por parte de Skinner.

Para o behaviorismo radical, o principal propósito, senão o único, do conhecimento científico é possibilitar a manipulação efetiva do mundo natural. Em diversos momentos, Skinner ressalta essa característica de sua filosofia da ciência: “Conhecimento científico é o que as pessoas fazem ao prever e controlar a natureza” (Skinner, 1956/1961j, p.215); “A ciência é em grande parte uma análise direta dos sistemas reforçadores encontrados na natureza; sua preocupação é facilitar o comportamento reforçado por elas” (Skinner, 1966/1969a, p.143); e “O ponto da ciência […] é analisar as contingências de reforço encontradas na natureza e formular regras ou leis com as quais se torna desnecessário expor‑se a elas a fim de se comportar efetivamente” (Skinner, 1969b, p.166).

Em outras palavras, a ciência nos permite conhecer de maneira acurada as contingências presentes no mundo; e a atividade científica é indispensável para o “aprimoramento” de nossas classes comportamentais no sentido de contribuir para o aumento da probabilidade de ocorrência de consequências reforçadoras. O aumento da ocorrência de consequências reforçadoras indica, por sua vez, que estamos agindo efetivamente no mundo. Uma das principais características da ciência é a criação de regras e leis que nos ajudam a agir efetivamente no mundo: não precisamos passar pelas contingências para saber como nos portar perante elas. Trata‑se do comportamento governado por regras (seção 2.5).

Nesse sentido, o valor da ciência é essencialmente prático. É por isso que Skinner (1969b, 1972d, 1979, 2004) afirma que as primeiras regras “científicas” talvez tenham sido os conselhos baseados na experiência empírica (“rules of thumb”) dos artífices que serviam bem aos propósitos práticos que os trabalhos exigiam. Todavia, embora a ciência tenha se desenvolvido a ponto de abarcar as mais complexas contingências do nosso mundo, o princípio ainda permanece o mesmo: promover a ação efetiva. De fato, Skinner (1969b, p.254) até mesmo contrapõe sua visão de ciência com a alternativa representacionista:

Geralmente se argumenta que a ciência está preocupada não apenas com a predição e controle, mas também com o entendimento ou ainda com a contemplação pura, mas o conhecimento científico não é uma percepção elaborada do mundo externo na mente do cientista, sendo antes o que o cientista faz com relação ao mundo.

É interessante notar que, no final, acabamos voltando ao tema que introduziu esta seção: o descaso de Skinner para com a discussão metafísica entre realismo e instrumentalismo. A ciência do comportamento proposta pelo behaviorismo radical não está interessada em desvendar a natureza da realidade. O seu propósito é mais moderado: promover condições para a ação efetiva. As regras e leis desenvolvidas por essa ciência, por sua vez, não pretendem ser formalizações que refletem o real – afinal, isso é em princípio impossível, já que as regras não substituem as contingências que descrevem – e nesse sentido não possuem “valor de verdade”. Elas não são verdadeiras ou falsas, mas podem ser julgadas pela sua efetividade. É possível sintetizar as razões que sustentam o desinteresse de Skinner pela metafísica seguindo estes passos: (1)

Para Skinner, o propósito da ciência como um todo é criar condições para ação efetiva, o que significa aumentar a probabilidade de ocorrência de consequências reforçadoras; (2) já o propósito da ciência do comportamento humano é produzir conhecimento pelo qual possamos prever e controlar o comportamento (condições necessárias para ação efetiva nesse contexto); (3) sendo assim, não é de interesse do behaviorista radical saber se sua teoria do comportamento é realista ou instrumentalista ou se os axiomas que a compõem são ver‑ dadeiros ou falsos, pois as consequências que controlam o seu comportamento, enquanto cientista do comportamento, são todas práticas; (4) é especialmente desimportante para o behaviorismo radical discorrer sobre a natureza substancial do mundo, pois de nada vale saber qual é a substância que o compõe, já que há neste mundo comportamento; (5) assim, discussões sobre percepção, conhecimento, agentes internos causadores do comportamento, dentre outras, não devem se prender ao discurso substancial, pois o que conta nesse caso é a relação;6 (6) o âmago da questão, portanto, está no caráter relacional do comportamento (seção 2.1).

Não é importante falar de “matéria” porque o que define o comportamento é a relação e não a substância que o compõe. Afinal, não é um dos princípios do behaviorismo radical estudar o comportamento pelos seus próprios termos e em seu próprio nível de análise (Skinner, 1931/1961c, 1938/1966a, 1961f, 1979, 1980/1998)? Sendo esses termos relacionais, a importância da substância se torna diminuta. A ausência da metafísica no behaviorismo radical só é mantida se não avançarmos em interpretações mais aprofundadas sobre essa filosofia da ciência. O termo chave para entender a ausência é: desnecessidade.

Não precisamos advogar um posicionamento metafísico para sermos cientistas do comportamento. Não precisamos fazer metafísica para fazer ciência no sentido proposto por Skinner.7 Por um lado, isso nos dá liberdade para continuar com a construção da teoria do comportamento sem nos preocupar com divagações metafísicas. Por outro lado, essa mesma abstenção abre as portas para diversas interpretações sobre a posição metafísica mais condizente com o behaviorismo radical.

Como já foi dito, o objetivo deste capítulo é desvendar a natureza do comportamento, o que significa buscar as propriedades que, se ausentes, resultam em sua inexistência. Trata‑se de um empreendimento metafísico acerca da ontologia do comportamento. Portanto, para que seu cumprimento seja possível, é preciso ir um pouco além do behaviorismo radical de “metafísica ausente”. No entanto, é necessário fazer isso a partir do próprio behaviorismo radical. No que tange ao comportamento, então, quais seriam as suas propriedades essenciais?

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REFERÊNCIAS:

A natureza comportamental da mente: behaviorismo radical e filosofia da mente / Diego Zilio. – São Paulo: Cultura Acadêmica, 2010.


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